Reflexão

Quem precisa de plástica?

Quem precisa de plástica?
Os cosméticos e as novas tecnologias
Por Sandra Kezen

 

Sandra Kezen é professora e coordenadora do Laboratório de Línguas da Faculdade de Direito de Campos e da Faculdade de Odontologia de Campos.
sandrakezen@fdc.

Como as novas tecnologias mudaram o mundo dos cosméticos? Na verdade, elas revolucionaram a indústria de cosméticos. Hoje a indústria de cosméticos instaura-se como uma nova fábrica de corpos que propõe a padronização da beleza.
Na intenção de abandonar seu caráter supérfluo, a indústria de cosméticos tem um discurso de inclusão no sentido de que os preços de seus produtos são acessíveis a todos. Além disso, para reafirmar a importância deles, a indústria de cosméticos procura enfatizar outras propriedades, além da embelezadora, de seus itens, que, por essa mesma razão, já não podem ser considerados supérfluos, sendo assim elevados à categoria de indispensáveis em nossa nécessaire do dia-a-dia.
Com esse discurso a indústria de cosméticos quer tornar o ideal de corpo e de beleza possível a quem o desejar. Para quem é adepto de produtos mais naturais, há os produtos à base de plantas, flores e sementes; para quem não se preocupa com isso há os produtos com ingredientes sintéticos, enfim, há todo um universo cosmético à disposição do consumidor.
A mídia aqui tem um papel fundamental: cabe a ela a divulgação dessa fábrica de beleza, capaz de operar milagres.

É proibido envelhecer

Se o conceito de antienvelhecimento algum dia esteve restrito à cirurgia plástica, hoje ele envolve variados recursos.
Na corrida pela juventude, a indústria de cosméticos também cresceu, desenvolveu novas fórmulas e hoje representa uma importante aliada na proteção da pele. Os resultados têm sido animadores graças à alta complexidade dos produtos, que são criados com variados ingredientes naturais e modernas tecnologias, como a biotecnologia vegetal e nuclear e até a engenharia genética.
Atualmente, há tratamentos para acabar com as indesejadas rugas ou para amenizá-las, para clarear manchas e diminuir olheiras, além dos já conhecidos produtos para a pele do rosto e do corpo, cabelos, unhas, pés e mãos.
Contudo, além de tratar os problemas já instalados na pele, a indústria de cosméticos hoje investe maciçamente na prevenção de possíveis problemas. Por isso, batons e bases de última geração contêm hidratantes e filtro solares, a grande arma contra o envelhecimento precoce causado pela excessiva exposição aos raios solares. Assim, mais que embelezar, esses produtos tratam a pele.

A globalização dos cosméticos

Para se adequar à globalização da beleza, as fábricas de cosméticos cada vez mais optam por usar a língua da globalização: o inglês. As fábricas de cosméticos evidentemente acreditam que o inglês dá um outro status a seus produtos, deixando-os com aparência mais sofisticada e por isso mais atraentes aos consumidores. Senão, vejamos: produtos para o corpo agora se chamam “body care”; para o cabelo, “hair care”, para a pele, “skin care”. Quanto aos produtos para maquiagem, esses se denominam “make up”: “eye shadow” é sombra; “eye liner” é delineador; “eye pencil” é lápis para o contorno dos olhos; “lipliner” é lápis para o contorno dos lábios; “foundation” é base; “mascara” é rímel; “lipstick” é batom e “lipgloss” é brilho labial. Os nomes de batons, sombras e blushes também usam o inglês. Na linha “body care” há os sabonetes líquidos perfumados, que agora se chamam “aroma therapy” ; cremes não oleosos se chamam “oil free” e óleos para o corpo se chamam “body oil”. Ainda nessa linha, ao procurar por um hidratante, há três opções: creme, loção ou gel, respectivamente, “cream”, “lotion” ou “gel”. A linha de produtos “hair care” é ainda mais abrangente: tintas para cabelo são “hair color”; condicionador é “conditioner” e cremes sem enxágue são os famosos “leave-in”. Dentro dessa linha encontramos os mais variados tipos de “shampoos”: “dry hair” para cabelos secos; oily hair” para os oleosos; “curly hair” para os cacheados; “difficult hair” para os rebeldes; “dyed hair” para os tingidos; “anti-frizz” para diminuir o volume dos cabelos; “split ends” para as pontas duplas.

A ditadura da beleza

Se por um lado os cosméticos melhoraram de qualidade e ficaram mais acessíveis, por outro lado a ditadura da beleza impõe-se com maior força em nossa sociedade.
Cosméticos são metáforas para a beleza, que é verdadeiramente o que os consumidores procuram e desejam. Por isso os anúncios de cosméticos são tão glamurosos: na realidade vendem a ilusão da beleza. E, no desejo de melhorar nossa aparência, por vezes tão descuidada com a correria da vida moderna, muitas vezes compramos apenas “promessas”, ou seja, produtos que, na verdade, não têm a eficácia que anunciam.
O que se observa, além da beleza plástica desses anúncios tão criativos e motivadores, é o discurso que as indústrias de cosméticos mantêm, insistindo para que seus produtos sejam consumidos. A idéia que subjaz aqui é a de que todos deveriam se cuidar ou procurar uma aparência mais jovem, o que não corresponde à verdade. Nem todo mundo quer mudar de aparência ou parecer mais jovem: algumas pessoas estão satisfeitas com sua aparência e não podem ser discriminadas por isso.
Por isso, atenção: para anúncios melhores, consumidoras mais atentas!

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