Crônicas Margarete Hülsendeger

Bonitinho, mas…

BONITINHO, MAS…

Margarete Hülsendeger

A beleza interessa nos primeiros quinze dias; e morre, em seguida, num insuportável tédio visual.

Nelson Rodrigues

 

Margarete Hülsendeger é Física e Mestre em Educação em Ciências e Matemática/PUCRS. É mestra e doutoranda em Teoria Literária na PUC-RS

Há algum tempo um amigo me encaminhou uma notícia – publicada no jornal espanhol El País – acreditando que ela talvez pudesse me interessar. A matéria, mesmo curta, tratava de um assunto que, na minha opinião, era um pouco assustador. Estou me referindo a uma nova “moda” chamada Bikini Bridge.

Se você ainda não sabe o que essa expressão significa aqui vai um breve esclarecimento.

Bikini Bridge (em português “ponte de biquíni”) iniciou como uma brincadeira quando entusiastas dessa “nova moda” começaram a compartilhar fotos nas redes sociais. Essa expressão se refere a como o biquíni fica apoiado apenas nos ossinhos do quadril, formando uma espécie de ponte (daí o nome), quando uma mulher está deitada. Se você ainda não conseguiu imaginar o que é o Bikini Bridge basta colocar a expressão no Google e fazer uma busca por imagens. Não terá nenhum problema em encontrar várias fotos.

Inicialmente, achei até “bonitinho”: corpos jovens, aparentemente saudáveis, com uma barriga absolutamente plana (ou com curvatura negativa), sustentando um pequeno pedaço de tecido sobre os ossinhos saltados do quadril. Depois, como seria normal, fiquei com um pouco de inveja, afinal nunca tive esse tipo de barriga, nem mesmo quando era jovem. E, por fim, quando fui à busca de mais informações senti uma espécie de mal estar, pois descobri que essa “moda” estava longe de ser saudável.

Em um dos sites de pesquisa encontrei a seguinte declaração da nutricionista Bia Rique, da clinica Ivo Pitanguy: “Só tem a ‘ponte’ quem tem o osso ilíaco – que fica no quadril – saltado. Existem mulheres muito magras que não têm essa abertura. Como nem todo mundo tem esse tipo físico, é um absurdo que isso seja apontado como tendência”. No entanto, mesmo sendo um absurdo, jovens, na maioria entre 15 e 19 anos, tendo ou não tipo físico, têm procurado atingir esse “ideal” de beleza física.

Em outra matéria sobre o mesmo assunto, publicada no jornal americano Daily Mail, encontrei uma declaração que me deixou ainda mais estarrecida. Segundo uma especialista em imagem corporal, fotos como as que estão sendo divulgadas livremente nas redes sociais estavam antes restritas a sites pró-anorexia. Dizer que fiquei espantada é pouco. Afinal, a anorexia é um grave distúrbio alimentar com múltiplas causas, que provoca mais perda de peso nas pessoas do que é considerado saudável para a idade e altura e pode, inclusive, levar a morte. Assim, fiquei com duas dúvidas. Como é possível existirem sites “pró-anorexia”? E como algo claramente doentio tornou-se moda?

De qualquer modo, essa polêmica me fez recordar de outras modas que em outros tempos também influenciaram as mulheres na busca do “corpo perfeito”. Nas décadas de 40 e 50 eram as “pin-ups-girls”. Desenhos ou fotografias de celebridades ostentando o que na época era considerado sexy em uma mulher: coxas grossas, seios volumosos e quadris largos. Depois nos anos 60 e 70, a voluptuosidade das curvas femininas foi substituída pela magreza andrógina de uma jovem de 16 anos com cabelos loiros muito curtos e imensos olhos realçados com camadas de rímel e cílios postiços, a modelo inglesa Twiggy. Um giro de 180º no padrão de beleza feminina.

O problema é que nas décadas seguintes – apesar da própria Twiggy ter considerado as modelos semianoréxicas que a seguiram como um “péssimo exemplo para as adolescentes” – esse “ideal” de beleza não se extinguiu. Ao contrário. Parece – a moda do Bikini Bridge é uma evidência disso – que o modelo “quanto mais magra melhor” está cada vez mais forte entre as adolescentes do século XXI. Meninas que por algum motivo desenvolveram uma imagem tão distorcida de si mesmas, a ponto de se acharem atraentes por se parecerem com cadáveres ambulantes.

Infelizmente, o fato é: não importa a tendência ou a época na qual uma moda surja tudo está de alguma forma ligado a maneira como a mulher se vê quando se olha no espelho. Junte-se a isso, o aumento da pressão social para que certos ideais de beleza se cumpram, independente de serem saudáveis ou não, teremos um número cada vez maior de mulheres sentindo-se ansiosas e, muitas vezes, deprimidas com o seu próprio corpo. No entanto, a verdade é que, a mulher verdadeiramente inteligente e orgulhosa do próprio corpo jamais busca os extremos (gordura ou magreza excessivas), porque como disse Oscar Wilde, “No culto da beleza não há nada de são. Esse culto é esplêndido de mais para ser são”.

 

HÜLSENDEGER, Margarete Jesusa Varela Centeno . BONITINHO, MAS…. REVISTA VIRTUAL PARTES, SÃO PAULO, 06 mar. 2014.

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