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Gestão democrática da educação: um desafio na formação teórico-prática dos educadores

GESTÃO DEMOCRÁTICA DA EDUCAÇÃO: UM DESAFIO NA FORMAÇÃO TEÓRICO-PRÁTICA DOS EDUCADORES

 

Vanuza Aparecida de Souza[1]

Vilma Aparecida de Souza[2]

Resumo

Vilma Aparecida de Souza -Professora do Curso de Pedagogia da Universidade Federal de Uberlândia- FACIP – Faculdade de Ciências Integradas do Pontal

O presente trabalho procura analisar as transformações políticas e os impactos do processo de implantação da gestão democrática nas escolas públicas e os desafios para a formação teórico-prática dos educadores. As novas demandas educacionais cada vez mais evidenciam a necessidade de uma formação teórico-prática dos educadores para suplantar os desafios na implementação da gestão democrática na educação.

Palavras-chave: Formação docente, Gestão democrática,  Políticas educacionais

 

Abstract

This paper analyzes the political changes and the impacts of the implementation process of democratic management in the public schools and the challenges for theoretical and practical training of educators. The new educational demands increasingly highlight the need for a theoretical and practical training of teachers to meet the challenges in the implementation of democratic management in education.

Keywords: Teacher education – Democratic management – Educational Policies

 

 

Vanuza Aparecida de Souza – Diretora Escolar da E. M. Professor Oswaldo Vieira Gonçalves -Rede Municipal de Ensino de Uberlândia-MG.
  1. Gestão democrática da educação: os embates no campo político e social brasileiro

 

                  O processo de “abertura política”, ao final da década de 80 do século passado, propiciou possibilidades de participação de vários setores na formulação de propostas para as esferas da sociedade, dentre elas, a educação.

                 No que se refere à educação, apesar de todos os obstáculos, lutas e embates, a mobilização para a gestão democrática da escola pública garantiu que a Constituição Federal, promulgada em 1988, incorporasse em seu texto a democratização da sociedade e da escola pública. Embora de forma vaga e imprecisa, o artigo 206 estabelece como princípio para o ensino a “gestão democrática do ensino público, na forma da lei”. (BRASIL, 1988).

                 Acompanhando a Carta Magna, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (Lei 9394/96) também adota o princípio da gestão democrática no que diz respeito à educação nacional. De acordo com a LDB nº 9394/96, art.14, os sistemas de ensino definirão as normas de gestão democrática do ensino público na educação básica a partir dos princípios:

I-participação dos profissionais da educação na elaboração do projeto pedagógico da escola;

II-participação das comunidades escolar e local em conselhos escolares ou equivalentes (BRASIL, 1996).

               Apesar do respaldo legal, efetivar o processo de implementação da gestão democrática tem sido um grande desafio em meio às incertezas de uma tradição política de governo calcada no autoritarismo e na centralização das decisões. Além desse aspecto, vale ressaltar que o contexto econômico e político atual, segundo a concepção de Estado e de acordo com seus aspectos ideológicos neoliberais, entendem que o controle sobre diversos setores sociais garante a implementação de suas políticas.

           Segundo Colares,

[…] a gestão democrática está sofrendo sérios riscos de ser inviabilizada, como decorrência da reação dos setores conservadores, principalmente em locais tradicionalmente controlados pelos coronéis e pelos dirigentes políticos, inconformados com o fato de as próprias comunidades tomarem as iniciativas das decisões (COLARES, 2003, p.97).

             Em meio às influências do “tecnicismo” e da Teoria do Capital Humano, a gestão educacional é concebida simplesmente pela ótica da técnica. O dirigente educacional limita sua ação à função de gerente, preocupada única e exclusivamente com o controle e a avaliação, num exercício meramente burocrático.

           Tendo em vista este passado autoritário e os riscos de ser inviabilizada, torna-se mister resgatar os clamores dos educadores pela democratização da sociedade e da escola pública, traduzidos nos preceitos legais da Constituição de 1988 e na LDB 9394/96.

          Para que a gestão democrática se realize é necessário assegurar a formação teórico-prática dos educadores.

  1. A gestão democrática e a formação teórico-prática dos educadores

 

A gestão da educação deve ser compreendida no âmbito das políticas educacionais, tendo em vista a conexão existente entre elas. Segundo Gracindo (1997), assumir uma postura crítica diante do atual modelo de gestão da educação no Brasil só é possível situando-se no contexto do estado e da sociedade, focalizando as relações latentes entre elas.

Para uma reflexão da gestão da educação nesta perspectiva crítica, para Casassus (2001) torna-se mister destacar alguns pontos relevantes: a mudança de paradigma econômico que se afirma no mundo – o neoliberalismo; as consequências desse paradigma nas esferas da sociedade; e os deslocamentos de prioridades e os riscos encobertos por esse paradigma para a gestão da educação.

            Este cenário ilustra intenções, projetos e ambiguidades das políticas educacionais em curso e sua sintonia com as estratégias neoliberais. Silva (1997) afirma que para um desvelamento das estratégias que o projeto neoliberal reserva para a educação é necessário compreender que este processo é parte de um processo mais amplo. É nesse projeto global que se insere a redefinição da educação e de sua gestão em termos de mercado.

             A partir desta análise, a implantação de uma gestão democrática não é tarefa simples. A tradição burocrática e as práticas neoliberais estão impregnadas nas mentalidades socializadas pela escola. Uma mudança na gestão da escola exige a quebra de paradigmas, a formulação de uma nova cultura, a substituição de valores e de concepções políticas.

            Segundo Gentili (1996), no campo específico da educação, o neoliberalismo, utiliza um conjunto de estratégias e receitas políticas que acarreta uma conseqüente mudança cultural, ou seja,

[…] o neoliberalismo ataca a escola pública a partir de uma série de estratégias privatizantes, mediante uma política de reforma cultural que pretende apagar do horizonte ideológico de nossas sociedades a possibilidade mesma de uma educação democrática, pública e de qualidade para as maiorias (GENTILI, 1996, p.87).

            Considerando essas análises, os debates sobre a democratização da gestão escolar devem resgatar as reflexões acerca das concepções de educação e sociedade, do papel e da função social da escola e de sua gestão. As discussões sobre a gestão democrática implicam clarificação a respeito da natureza política da gestão escolar. Uma definição política de gestão democrática permite distinguir os conceitos de participação restrita e em consonância com as formas de controle, como os defendidos pelo discurso daqueles que defendem a pedagogia da “qualidade total”, de conceitos de participação efetiva e cidadã, comprometida com a escola pública, gratuita e democrática, em defesa dos excluídos, para além de políticas restritivas.

             A gestão democrática é conquistada por meio de um processo de aprendizado e de luta política que ultrapassa a prática educativa, sendo essa situada numa dimensão social mais ampla. Nessa direção, reflexões sobre Estado e as políticas educacionais são fundamentais para um exame crítico do campo educativo.

  1. Considerações finais

             A gestão democrática faz parte de um processo amplo que envolve mecanismos, procedimentos e instrumentos de ação que ultrapassam o interior das unidades escolares, atingindo níveis da política educacional, do planejamento educacional e da formação dos profissionais da educação.

             O processo de implantação da gestão democrática representa uma experiência singular que merece ser analisado, envolvendo estudos acerca do contexto político de sua efetivação e de seus impactos, revelando a complexidade da organização do cotidiano escolar.

              A análise da gestão democrática não pode estar limitada apenas à prática de eleição de diretores. A gestão democrática na escola não está garantida somente com a eleição de diretores, tudo dependerá do jogo de forças envolvidas e da suplantação dos entraves cristalizados no cotidiano escolar, considerando que, o clima criado em torno da perspectiva de uma gestão democrática parece não ter sido suficiente para resolver os problemas internos de escola e ainda parece ter criado outros problemas.

            Por outro lado, é preciso que a gestão democrática deva ser capaz de encontrar o equilíbrio entre as diversas expectativas e opiniões dos atores envolvidos no processo.

            Destaca-se, por fim, que as inferências apontadas nesta pesquisa permitem vislumbrar os limites para a implementação plena da gestão democrática na escola pública. Apesar de todos os fatores e mecanismos de gestão democrática do ensino público convergirem para a democracia e a participação dos sujeitos nos rumos da escola, a democracia e a participação ainda têm desempenhado um papel periférico, diante do cenário macro de autoritarismo e centralização em que estão inseridos os sistemas de ensino.

                  Nesse sentido, as novas demandas educacionais cada vez mais evidenciam a necessidade de uma formação teórico-prática dos educadores para suplantar os desafios na implementação da gestão democrática na educação. Essa formação implica uma conexão entre cotidiano escolar e políticas educacionais, a partir de um novo sentido para a gestão da educação, comprometida com a democratização do espaço escolar e da sociedade. Uma formação teórico-prática dos educadores para uma maior compreensão da dinâmica das relações entre a escola e os órgãos superiores da administração, com vistas a vislumbrar as possibilidades de uma escola democrática com uma proposta participativa, capaz de romper a lacuna existente entre a intenção e o gesto, o legal e o real, o discurso e a prática cotidiana.

4. Referências bibliográficas:

BRASIL Constituição da República Federativa do Brasil (1988). Rio de Janeiro: FAE, 1988.

______.Lei nº 9394 de 20 de dezembro de 1996- estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Diário Oficial da União. Brasília, DF.

CASASSUS, Juan. A reforma educacional na América Latina no contexto de globalização. In: Cadernos de Pesquisa. São Paulo, nº 114, p. 7-28, nov. 2001.

COLARES, Anselmo Alencar e COLARES, Maria Lília I. Sousa. Do Autoritarismo repressivo à construção da democracia participativa: história e gestão educacional. Campinas, SP: Autores Associados, São Paulo, SP: ANPAE, 2003.

DOURADO, Luiz Fernandes. A reforma do estado e as políticas de formação de professores nos anos 1990. In: DOURADO, Luiz Fernandes e PARO, Vitor Henrique (org). Políticas Públicas & Educação Básica. São Paulo: Xamã, 2001, p. 49-58.

GENTILI, Pablo. Adeus à Escola Pública: a desordem neoliberal, a violência do mercado e o destino da educação das maiorias. In: GENTILI, Pablo (org). Pedagogia da Exclusão: Crítica ao Neoliberalismo em Educação. Petrópolis, RJ: Vozes 1996.

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KUENZER, Acácia Zeneida. As mudanças no mundo do trabalho e a educação: novos desafios para a gestão. In : FERREIRA, Naura S. C. (org). Gestão democrática da educação: atuais tendências, novos desafios. São Paulo: Cortez,2003.

SILVA, Tomaz Tadeu da. A “nova” direita e as transformações na pedagogia da política e na política da pedagogia. In: GENTILI, Pablo e SILVA, Tomaz Tadeu da (org). Neoliberalismo, Qualidade Total e Educação: visões críticas. Petrópolis, RJ: Vozes, 1997.

Como gostaria que o texto fosse citado:

SOUZA, Vanuza A.; Vilma A. SOUZA. GESTÃO DEMOCRÁTICA DA EDUCAÇÃO: UM DESAFIO NA FORMAÇÃO TEÓRICO-PRÁTICA DOS EDUCADORES. P@rtes…

 

 

 

 

[1] Diretora Escolar da E. M. Professor Oswaldo Vieira Gonçalves -Rede Municipal de Ensino de Uberlândia-MG.

[2] Professora do Curso de Pedagogia da Universidade Federal de Uberlândia- FACIP – Faculdade de Ciências Integradas do Pontal.

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