Saúde

Capacitação dos Agentes Comunitários de Saúde na Consolidação da Saúde Básica

Jader Luís da Silveira*

Resumo

O agente comunitário de saúde realiza diversas atividades no âmbito da comunidade no qual está inserido. O objetivo é analisar a importância do profissional buscar qualificação para melhor desempenho de suas atividades. O agente deve unir os conhecimentos populares adquiridos no cotidiano com outros científicos a ser buscados na capacitação. Concluiu-se que a capacitação e qualificação dos agentes é vista como ponto positivo para tais profissionais, além de proporcionar melhorias na qualidade dos atendimentos prestados e nos serviços de saúde da comunidade.

Palavras-chave: Agente,  Saúde, Comunidade, Capacitação.

Abstract

The community health agent performs various activities within the community in which he is inserted. The objective is to analyze the importance of the professional seeking qualification to better perform their activities. The agent must unite the popular knowledge acquired in daily life with other scientists to be sought in the training. It was concluded that the qualification and qualification of the agents is seen as a positive point for these professionals, besides providing improvements in the quality of care provided and in the community health services.

Keywords: Agent. Health. Community. Training.

 

  1. Introdução
Jader Luis da Silveira Professor e Biólogo. Graduado em Ciências Biológicas pela Universidade Federal de Alfenas – UNIFAL-MG. MBA Executivo em Saúde e Especialista em Análises Clínicas e Microbiologia pela Universidade Candido Mendes – UCAM. E-mail: jaderbio@outlook.com

O tema a ser abordado por este trabalho será o agente comunitário de saúde frente às suas funções exercidas na comunidade. Diante disso, pretende conhecer a importância de tal profissional buscar qualificação e capacitação para o exercício das atribuições da profissão.

Neste contexto, tomou-se como base as seguintes questões:

  • Quais são as funções exercidas no cotidiano dos agentes comunitários de saúde em atuação na comunidade?
  • Qual é a importância do curso de capacitação para os agentes comunitários de saúde desempenharem suas funções e estabelecer atendimento de qualidade?

Os agentes comunitários de saúde, em algumas vezes são esquecidos por parte da população e da unidade básica de saúde onde atua, sem saber da real importância que possui. Esse profissional desempenha importantes funções na comunidade, sendo considerada a primeira etapa do processo de educação em saúde, além de prevenção e controle de doenças.

A relevância dada pelo agente comunitário de saúde é defendida por vários autores. Os agentes são vistos como uma interligação entre a comunidade e a unidade básica de saúde, através do conhecimento popular da primeira e o científico da segunda, realizam o trabalho de promoção da saúde e orientação dos moradores.

Conforme Marzari, Junges e Selli,

No aspecto formal e legal, o agente funciona como elo entre a comunidade e a equipe de saúde. Sua atividade une dois mundos distintos, o da equipe com seu conhecimento científico, e o da comunidade, com sua cultura e seus costumes. Por isso, a integração do ACS na equipe multiprofissional é importante, por que decodifica as necessidades da comunidade (MARZARI; JUNGES; SELLI, 2011, p.875).

Diante da importância do agente na promoção de saúde, o objetivo principal desse artigo é investigar a postura desse trabalhador diante do seu papel, inserido na comunidade e como a capacitação desse profissional permite a melhoria do atendimento oferecido aos moradores.

Para a realização desse trabalho e atingir os objetivos propostos, foi realizada uma pesquisa bibliográfica a partir de análise minuciosa da literatura disponível em artigos científicos e em base de dados de revistas especializadas.

A fundamentação para a redação do artigo foram embasadas em trabalhos feitos por: Ferraz e Aerts (2005), Marzari, Junges e Selli (2011), Nascimento e Correa (2008), Gomes e outros (2009), Nunes e outros (2002), Santos e outros (2011) e Tomaz (2002).

  1. Referencial Teórico

Os agentes comunitários de saúde são profissionais protagonistas na estratégia da Saúde da Família. Eles são responsáveis por desempenhar funções técnicas na comunidade, por meio do diálogo e conscientização, fazendo a interlocução entre a unidade básica de saúde e as famílias. Essa tarefa é considerada um meio de aproximar as famílias, que se afastaram ou não possuem acesso aos serviços de saúde básica, aos serviços da unidade básica de saúde da localidade.

As atividades desempenhadas pelos agentes são diversas: visitas domiciliares, orientação sobre calendário de vacinas, prevenção de doenças, educação em saúde, higiene, cadastramento, cuidados à saúde do idoso, da criança e do adolescente, do homem e da mulher, além de orientações à saúde mental. São exercidas também, atividades que não fazem parte dos conhecimentos que o profissional possui, como funções administrativas na unidade básica de saúde.

Apesar da grande importância dos agentes, no início, os governantes eram contra a implantação do Programa de Agentes Comunitários de Saúde (PACS). Entendiam que a implantação seria uma forma de aumentar o quadro de funcionários, gerando maiores gastos para o Estado. O discurso defendido por eles é, que seria inadequado e inviável a contratação de funcionários sem formação acadêmica, e que, a preferência seria dada aos médicos, enfermeiros e especialistas em saúde.

Conforme Gomes e outros (2009), em 1991, o Ministério da Saúde contrariou essa ideia e lançou o Programa de Agentes Comunitários de Saúde que foi ampliado para o Programa Saúde da Família em 1994. Os agentes comunitários de saúde surgiram para dar voz a população e servir de elo entre a comunidade e as unidades básicas de saúde.

Com a estratégia da Saúde da Família, o governo passa a focar na família, mudando assim o eixo anterior, que se preocupava com o indivíduo. Os agentes nessa perspectiva, contribuem para o fortalecimento do Sistema Único de Saúde (SUS).

Nascimento e Correa (2008), destacam que o agente comunitário de saúde cria vínculos com a comunidade, visto que o profissional apresenta como requisito básico para a ocupação do cargo, ter residência no bairro de atuação. Dessa forma, ele convive com os moradores, sabe dos anseios, dificuldades e problemas enfrentados no local.

Para a candidatura ao cargo de agente, ficou definido pelo Ministério da Saúde, de acordo com Santos e outros que,

[…] trabalhadores independentemente do nível de escolaridade, deveriam cumprir requisitos formais de residir há pelo menos dois anos na comunidade onde atuaria; ter idade mínima de dezoito anos; saber ler, escrever; ter disponibilidade de tempo integral para exercer suas atividades (SANTOS et al, 2011, p.1025).

O agente comunitário de saúde é a figura protagonista da estratégia da saúde da família, visto que ele desempenha um papel no âmbito da unidade de saúde da família e fora dela, interagindo e mantendo contato constante com as famílias da localidade de atuação. Através desse trabalho, ele cria laços de confiança e amizade com a população.

O agente quando faz um bom trabalho, consegue despertar confiança na comunidade, tornando-o um bom representante das demandas da área de atuação e tendo seu trabalho reconhecido. Assim, é imprescindível que o profissional faça um trabalho de qualidade para que seja obtido seu reconhecimento.

Em contrapartida, Marzari, Junges e Selli (2011) e Ferraz e Aerts (2005), diagnosticaram que o fato do agente morar na localidade onde trabalha, nem sempre gera confiança pelos moradores. Esse fato pode ser explicado em parte, pelos autores, quando relatam que os agentes mais velhos tendem a possuir mais amigos no bairro e como se espera, também possuem inimigos, além de serem mais resistentes a inserção de novos aprendizados relacionados a saúde. Já os agentes mais jovens não possuem grandes vínculos de amizades e nem inimizades, porém já são mais abertos a aprender e buscar novos conhecimentos em saúde.

Um outro ponto negativo a ser considerado a respeito dos agentes é o nível de escolaridade, que como citado anteriormente, não é exigido para a investidura no cargo. Para o exercício da profissão é exigido apenas que o trabalhador saiba ler e escrever.

Apesar da ausência de cobrança de escolaridade mínima como requisito para um candidato se tornar um agente comunitário de saúde, o próprio Ministério da Saúde (1998), estabelece como parte das atribuições dos agentes, “orientar as famílias para a utilização adequada dos serviços de saúde” e “informar os demais membros da equipe de saúde acerca da dinâmica social da comunidade, suas disponibilidades e necessidades”.

Considerando os fatores citados anteriormente, torna-se necessário realizar uma formação inicial e continuada dos agentes comunitários de saúde, para que esses profissionais possam atender as demandas da comunidade de forma correta e eficaz, buscando a solução de problemas de acordo com as prioridades e atenda as atribuições estipuladas pelo Ministério da Saúde.

Nesse sentido, a capacitação desses profissionais e a educação permanente, se torna um instrumento de grande valia nos atendimentos prestados na comunidade. Com isso, conforme Nunes e outros (2002), passam a dispor de diferentes conhecimentos e saberes para realizar a orientação dos moradores, a respeito de assuntos relacionados à saúde e prevenção de doenças.

O agente comunitário de saúde aproxima a comunidade aos serviços médicos e da unidade básica de saúde. O profissional capacitado poderá fazer essa aproximação das famílias, auxiliando a prevenção e o enfrentamento de doenças de maneira mais eficaz.

Nascimento e Correa (2008) relatam em sua pesquisa sobre a capacitação e qualificação, que os agentes comunitários de saúde tiveram dificuldades no início do curso, devido ao fato que o conhecimento adquirido na capacitação era visto de forma diferente da realidade enfrentada por eles na prática. A linguagem e rigor científico que os professores utilizavam também foi um ponto relacionado a dificuldade dos alunos.

Com o término do curso, os agentes sentiram-se mais seguros para o exercício da função, com maior domínio e autonomia de assuntos do cotidiano da saúde pública e da unidade básica de saúde. Esse curso também melhorou a forma de realizar a promoção e a educação em saúde, fazendo com que a comunidade tivesse melhor qualidade de atendimento. Daí, a reafirmação da importância da inclusão dos agentes comunitários saúde em um processo de educação permanente para que, a qualidade de serviços prestados sejam primordiais para que a comunidade adquira melhor qualidade de vida.

Como o foco do trabalho do agente se concentra na família, faz com que o nível do trabalho se torne mais complexo e abrangente, exigindo um nível de escolaridade mais elevado e necessitando de capacitação e qualificação. Aliás, a própria consolidação do SUS depende da capacitação da equipe da saúde da família, inclusive dos agentes.

A estrutura da capacitação não deve ser fragmentada em conteúdos temáticos, no formato de minicursos, workshops ou palestras, como se costuma fazer nas secretarias municipais de saúde. Esse modelo de capacitação apenas sobrecarrega os agentes, pois terão que desempenhar funções que não são atribuições da função, como combate ao mosquito da dengue, reclamações, entre outras.

A capacitação fragmentada e sem estruturação faz com que o conhecimento adquirido seja insignificante em relação às demandas que lhes são entregues no cotidiano da função, além de não permitir o desenvolvimento da criação de novas competências para o cargo.

Tomaz chama atenção quando define como devem ser estruturados os cursos de capacitação dos agentes comunitários de saúde:

Os programas educacionais devem ser elaborados e baseados no desenvolvimento de competências, utilizando métodos de ensino-aprendizagem inovadores, reflexivos e críticos, centrados no estudante, e, quando possível, incluindo novas tecnologias, como a educação à distância. Além disso, dentro desse contexto, o desenvolvimento de algumas competências transversais, como a capacidade em trabalhar em equipe e a comunicação, devem fazer parte de qualquer programa educacional do ACS e dos outros profissionais de saúde (TOMAZ, 2002, p. 87).

Os cursos de capacitação nesse sentido, devem ser constantes e baseados no contexto prático e cotidiano que os agentes vivem, além do conhecimento científico da academia. Importante ressaltar que o conhecimento popular adquirido na comunidade, é tão importante quanto o conhecimento biomédico e científico, buscado pelos agentes comunitários de saúde em cursos técnicos. Não é intenção de nenhum curso efetuar essa modificação e substituição. O ideal é fazer com que o agente seja o seu próprio construtor do seu conhecimento.

O objetivo do curso é disponibilizar diferentes instrumentos e recursos para que o agente consiga ter maior domínio das situações cotidianas. Gomes e outros (2009) também apontam que o agente deve ser visto como uma figura transformadora da comunidade, de acordo com sua organização e buscando o diagnóstico de situações vividas no dia-a-dia.

Importante frisar que existem agentes com plena consciência da necessidade de se qualificar e estudar, para que sejam obtidos melhores resultados nas atividades e atendimentos por eles prestados. Esses trabalhadores fazem ciência de que o cargo que lida com vida e saúde, exige tanto o conhecimento popular, quanto o científico, conforme menciona Marzari, Junges e Selli:

As agentes buscam um conhecimento técnico, por que querem igualar-se profissionalmente aos outros membros da equipe e, por falta de consciência sobre seu papel na comunidade, pensam que não se legitimam apenas pelo conhecimento cultural das peculiaridades da comunidade. Se para o desempenho de suas tarefas é importante o conhecimento popular, a busca de formação não necessariamente passaria pelos cursos técnicos de enfermagem, mas pela sua capacitação para o papel social (MARZARI; JUNGES; SELLI, 2011, p.877).

  1. Discussões

Nesse cenário, os gestores em saúde devem estipular metas para que os cursos sejam abrangentes e que a maioria dos funcionários tenham oportunidades de se qualificar. Para que isso ocorra, os gestores podem buscar parcerias com colégios, escolas, universidades, sendo públicos e/ou privados, para que possam elaborar, ofertar e oferecer estrutura para o funcionamento do curso.

Os gestores em saúde podem buscar apoio de gestores de municípios vizinhos, de forma que a abrangência do curso também seja expandida para outras áreas. Os próprios agentes podem atuar na divulgação dessa estratégia, convidando outros colegas e mostrando à comunidade a qualidade do trabalho efetuado nos bairros.

Torna-se necessário, além da qualificação dos agentes em exercício, criar meios de contratação de acordo com a escolaridade e com a devida capacitação para realizar as funções do cargo ocupado. Esse profissional capacitado terá melhores condições para orientar a comunidade quanto à prevenção de doenças, conscientização concernente ao álcool e drogas, problemas vividos na localidade, calendário de vacinas, educação e promoção da saúde. O agente com disponibilidade de agregar novos conhecimentos, traz maiores benefícios para a comunidade nos serviços prestados, além de melhorar a qualidade dos atendimentos e da promoção de saúde.

  1. Conclusões

Os agentes comunitários de saúde são profissionais que resolvem problemas ligados à saúde na comunidade, como orientação, prevenção de doenças, além de realizar a educação e promoção de saúde. Nessa relação, criam laços com a população, participando de problemas sociais, agindo como amigo dos indivíduos da comunidade, de forma que proporciona apoio nas tomadas de decisões e em momentos difíceis.

Esses trabalhadores são vistos pela comunidade como pessoas privilegiadas e com certo poder de resolver problemas da localidade. Para tanto é primordial a busca de atualização constante. Nessa perspectiva, a criação de curso de capacitação para os agentes são vistos como um instrumento para adquirir conhecimentos, competências e habilidades para o exercício da função, além de oferecer certificação.

Existem cursos técnicos e de capacitação disponíveis para os agentes comunitários de saúde em algumas cidades e estados brasileiros, embora essas experiências não tenham alcançado uma grande parcela desses profissionais. Há profissionais que buscam a formação e outros mais resistentes, porém não se pode negar que a educação permanente é um fator primordial para o exercício das funções.

Cabe aos gestores em saúde, buscar parcerias com universidades, escolas técnicas e instituições de ensino que possam elaborar e promover o curso, abrangendo um grupo máximo possível de agentes comunitários de saúde. Após essa capacitação, os gestores devem buscar formas de que os conhecimentos adquiridos no curso de qualificação não seja a formação final, mas um meio de estabelecer a educação permanente para constante atualização dos profissionais. Nesse contexto essa iniciativa poderá abrir portas para que outros gestores também adotem essa ideia.

Faz-se necessário, então, buscar a identidade do agente como um profissional com competências e habilidades que sejam essenciais para a promoção da saúde da comunidade em que está inserido, sabendo incorporar conhecimentos e estratégias inovadoras, de forma que estará desempenhando um trabalho de maior qualidade e consolidando a saúde pública para acesso de todos.

Qualquer esforço aplicado a capacitação dos agentes comunitários de saúde é uma excelente oportunidade de qualificar tais profissionais e proporcionar a população serviços de saúde qualidade e excelência.

Referências Bibliográficas

FERRAZ, Lucimare.; AERTS, Denise Rangel Ganzo de Castro. O cotidiano de trabalho do agente comunitário de saúde no PSF em Porto Alegre. Ciência & Saúde Coletiva, v. 10, p. 347-355, 2005.

GOMES, Karine de Oliveira et al. A práxis do agente comunitário de saúde no contexto do programa saúde da família: reflexões estratégicas. Saúde e Sociedade, v. 18, p. 744-755, 2009.

MARZARI, Carla Kowalski.; JUNGES, José Roque.; SELLI, Lucilda. Agentes comunitários de saúde: perfil e formação. Ciência & Saúde Coletiva, v. 16, p. 873-880, 2011.

MINISTÉRIO DA SAÚDE. Saúde da família: uma estratégia para a reorientação do modelo assistencial. Brasília: MS. 1998.

NASCIMENTO, Elisabet Pereira Lelo.; CORREA, Carlos Roberto da Silveira. O agente comunitário de saúde: formação, inserção e práticas. Cadernos de Saúde Pública, v. 24, n. 6, p. 1304-1313, 2008.

NUNES, Mônica de Oliveira et al. O agente comunitário de saúde: construção da identidade desse personagem híbrido e polifônico. Cadernos de Saúde Pública, v. 18, p. 1639-1646, 2002.

SANTOS, Karina Tonini dos et al. Agente comunitário de saúde: perfil adequado a realidade do Programa Saúde da Família?. Ciência & Saúde Coletiva, v. 16, p. 1023-1028, 2011.

TOMAZ, José Batista Cisne. O agente comunitário de saúde não deve ser um “super-herói”. Interface Comun Saúde Educ, v. 6, n. 10, p. 75-94, 2002.

* Professor e Biólogo. Graduado em Ciências Biológicas pela Universidade Federal de Alfenas – UNIFAL-MG. MBA Executivo em Saúde e Especialista em Análises Clínicas e Microbiologia pela Universidade Candido Mendes – UCAM. E-mail: jaderbio@outlook.com

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