Educação Educação Ensino

ESTRATÉGIAS DE ENSINO: A CONTAÇÃO DE HISTÓRIAS COMO PRÁTICA PEDAGÓGICA

Patrícia Berlini Alves Ferreira da Costa*

Fabiana Holler Baptista*

 

RESUMO

Patrícia Berlini Alves Ferreira da Costa – Formada em Letras e Pedagogia pela Universidade Federal de Rondônia. Pós-Graduada em Psicopedagogia Clínica e Institucional pela UNINTER. Pós-Graduada em Libras pela Faculdade de Santo André – Vilhena/RO. Orientadora Educacional do Instituto Federal de Rondônia. E-mail: patricia.berlini@ifro.edu.br

Esse artigo apresenta um relato de experiência correspondente a trajetória de uma professora do Ensino Fundamental e de sua prática pedagógica com a contação de histórias para as crianças do 5º ano da escola COOPEVI – Cooperativa Educacional de Vilhena/RO. O trabalho realizado partiu de estratégias de ensino variadas. Dessa forma, foram utilizados recursos, como: livros, aventais, fantasias, fantoches, entre outros. O objetivo desse estudo é o de demonstrar a importância do contar histórias às crianças a fim de fomentar o hábito de leitura dos leitores em formação.

PALAVRAS-CHAVE: Contação de histórias; Criança; Estratégias de ensino; Professor.

ABSTRACT

This article presents an experience report corresponding to the trajectory of an elementary school teacher and her pedagogical practice with storytelling for children in the 5th year of COOPEVI – Educational Cooperative of Vilhena-RO. The work carried out started from varied teaching strategies. I this way, resources were used, such as: books, aprons, costumes, puppets, among others. The goal of this study is to demonstrate the importance of telling stories to children, in order to promote the reading habit of readers in training.

KEYWORDS: Storytelling; Children; Teaching strategies; Teacher.

 

  1. Introdução

 

Quem de nós, quando éramos crianças, não gostávamos de ouvir uma boa história contada por nossos pais ou nossos avós. Ficávamos horas e horas nos deleitando e nos instruindo com as palavras mágicas que aguçavam a nossa imaginação: Era uma vez. Muitas vezes, já tínhamos nossa personalidade literária formada. Ora, de idade a idade, os gostos se variavam. Dos príncipes e princesas a grandes histórias de assombração, lendas urbanas ou folclóricas. O ouvir era mágico. E a magia se dava pelo contar e pelo ouvir. As crianças gostam de ouvir, de contar, de recontar, de (re) ouvir uma boa história. Podemos dizer que a contação de histórias é uma arte cuja literatura escolhe seus intérpretes a fim de aperfeiçoá-los para um mundo paralelo ao nosso. Como bem disse Coelho,

Nesse mundo mágico, às extraordinárias aventuras dos Cavaleiros e suas amadas Damas misturam-se o sobrenatural diabólico (magos, duendes, particularmente o fabuloso Merlin), o maravilhoso das metamorfoses e a magia das fadas, em sua ambivalência de seres benéficos e maléficos (COELHO, 2003, p.64)

É pela imaginação que o homem encontra a si mesmo e busca um apaziguamento para os conflitos que destoam no seu interior. Por isso a importância de se contar histórias para o público, ainda, pueril.

Fabiana Holler Baptista – Formada em Economia pela Universidade Federal de Mato Grosso-UNEMAT. Pós-Graduada em Gestão Empresarial e Recursos Humanos pela Faculdade da Amazônia-RO.

Em seu livro, Crítica, Teoria e Literatura infantil (2015), Peter Hunt fala sobre alguns apontamentos importantes ao se ler, ou contar, uma história para a criança. Um de seus principais questionamentos é sobre a forma que o adulto utiliza na hora da leitura de uma história para o público infantil. Sob essa perspectiva, o autor traz os seguintes questionamentos: “Você lê como a criança que foi, ou como a criança que você pensa ser? Recorre à sua autoimagem de criança ou à memória da “sensação” de leitura da época da infância” (HUNT, 2015, p. 58). Sutilezas complicadoras que nos fazem refletir sobre até que ponto conseguimos esquecer nossas experiências adultas ao contarmos uma história para o leitor mirim.

     De acordo com Bruno Bettelheim (2017, p.11): “Para que uma história realmente prenda a atenção da criança, deve entretê-la e despertar sua curiosidade. Contudo, para enriquecer a sua vida, deve estimular-lhe a imaginação”. Assim, no entendimento de Hunt, precisamos contar histórias como a criança que fomos; imaginar como uma criança imagina, além de recorrer a nós mesmos como se ainda fôssemos crianças a fim de desviar a atenção do pequeno leitor para um mundo que veste fantasia. Como afirma Bettelheim: entreter, despertar, enriquecer e estimular.

     Sendo assim, apresentamos nesse artigo as estratégias de ensino correspondentes à experiência de uma professora com a contação de histórias durante seu trajeto de vida profissional na escola COOPEVI – Cooperativa Educacional de Vilhena/RO. Diante disso,  essa pesquisa tem por objetivo demonstrar a importância da contação de histórias para o desenvolvimento íntegro da criança, além de estimular os profissionais da educação a utilizarem a contação de histórias como entretenimento, estímulo a imaginação, a criatividade e a leitura da criança. Para tanto, serão apresentados nesse estudo algumas estratégias e recursos que servirão de subsídios aos profissionais da educação, aos contadores de histórias.

  1. A contação de histórias: entre formas e jeitos

 

Segundo Abramovich (2004, p. 24) “Ouvir histórias é viver um momento de gostosura, de prazer, de divertimento dos melhores… É encantamento, maravilhamento, sedução”. É com esse envolvimento que a criança dialoga consigo mesma, repensa seu mundo, seus conflitos internos e acalma suas emoções.

Para que uma história chame a atenção da criança e desperte sua curiosidade, existem maneiras de se contar e recursos a se utilizar. Entre formas e jeitos estão o tom de voz, a caracterização do contador, a expressão facial, a musicalização, entre outras maneiras de encantamento. De acordo com Caldin (2002), é necessário captar o ritmo das histórias, usar todas as possibilidades de voz, imitar e sussurrar o som da natureza e o ruído dos animais, criar um clima não só de envolvimento, mas também de encantamento. Momento síncrono ao perfil de leitor que se tem no público infantil.

Nesse sentido, Lima e Valiengo afirmam que

Quando a criança ouve a leitura, a contação de histórias, lê ou conta uma história, ativa uma série de capacidades, como a memória (recorda-se de outros momentos, de histórias ouvidas e lidas), a atenção (se a história ou o recurso utilizado para a contação da história envolve completamente, ela para ouvir, assume uma atitude de ouvinte atento), a fantasia (imagina-se parte da história contada, visitando mundo e personagens, ativando suas emoções). Isto é, o livro traz cristalizadas em si as capacidades humanas e, na atividade de contação ou leitura de histórias, a criança vivencia ou ativa o uso dessas capacidades, tornando-as individuais, parte de sua humanidade (LIMA; VALIENGO, 2011, p. 56).

Ler e contar histórias de forma intencional e planejada: o quanto isso é importante para estimular a imaginação, a criatividade e o hábito de leitura da criança. Os recursos, as fantasias, os livros, o espaço, a expressão facial, o tom de voz, a musicalização e o jogo corporal, fazem parte disso. De acordo com Brito, “é possível sonorizar histórias usando objetos e materiais sonoros” (BRITO, 2003, p.163). Além da voz, como o principal recurso, temos os aventais, o tapete mágico, a caixa de contação, os tecidos, entre outros adereços que ficam por conta da criatividade do contador de histórias. Dessa forma, cabe aos profissionais da educação, que atuam tanto na Educação Infantil quanto no Ensino Fundamental, buscarem estratégias de ensino que favoreçam, portanto, a sua prática pedagógica, principalmente, ao considerarem a relevância dessa atividade para a formação íntegra do público alvo da literatura infantil.

  1. Relato de experiência: a contação de histórias na prática

 

Quando trabalhei na Cooperativa Educacional de Vilhena/RO, por 5 anos, uma das estratégias de ensino mais utilizadas nas minhas aulas era a contação de histórias. Isso porque é através da imaginação que a criança constrói e significa o aprendizado. Daquilo que lhe parece real aos seus olhos, mesmo que envolva o sonho e a fantasia. É a aprendizagem através do imaginário.

Alguns dos recursos que sempre utilizei, além dos livros, foram os aventais e as fantasias (Figura 1) que como bem disse Brito a criança imagina-se como parte da história que está sendo contada e ativa suas emoções. São recursos que prendem a atenção da criança.

Figura 1. Contação de histórias com o uso de fantasias e aventais.

Como na história da Menina Bonita do Laço de Fita (1996), primeiro avental à esquerda, de Ana Maria Machado, por exemplo, que trata sobre o amor platônico de um coelho que quer a todo custo ser como a Menina Bonita cujos traços físicos são herança genética de sua família. Essa história, no avental, possui, além de todos os personagens, também os fatos que dão sequência a narrativa, como: a parte na qual o coelho come jabuticaba, toma café, tem dor de barriga, pula na lata de tinta, enfim – o que faz um paralelo entre o plano real e o plano imaginário da criança. Uma fusão.

Além dos aventais, um dos recursos que chamam bastante atenção do público infantil são as fantasias (segunda imagem da esquerda para a direita). É o momento que os personagens pulam para fora dos livros e vão de encontro aos pequenos leitores a fim de trazer suas características mais importantes. É o contato entre personagem e ouvinte. Quem não gostaria de perguntar à Emília, do Sítio do Pica-Pau Amarelo, sobre curiosidades que os livros não dizem. As crianças.

Logo, sempre comprei meus próprios adereços de contação de histórias, entretanto, há várias possibilidades de produzirmos nossas próprias fantasias. Ainda, uma roupa alegre, colorida, feita de retalhos (terceira imagem da esquerda para a direita), exclui a identidade pessoal do contador de histórias para uma caracterização que não seja a de sua vida real. Trabalha com a criatividade e com a imaginação da criança. Nada do que uma boa caracterização e de um espaço bem planejado (Figuras 2 e 3) para despertar a curiosidade e alimentar o faz de conta do leitor mirim.

Figuras 2 e 3. Contação de histórias na grama e na livraria: Café e Letras.

 

            Na primeira imagem, à direita, foi contada a história A Colcha de Retalhos (2010), de Conceil Corrêa da Silva. Esse livro narra a história de Felipe que gostava muito de ir à casa de sua avó. Além dela preparar deliciosos bolos, era uma ótima contadora de histórias. Certa vez, ao costurar uma colcha de retalhos coloridos e cheio de histórias, a avó de Felipe ia costurando lembranças a cada novo retalho. Dessa forma, Felipe conheceu a saudade. Para essa história, utilizamos, como recurso, um vestido e um tapete de retalhos. Além disso, utilizamos a grama como espaço pedagógico. As crianças sentaram em círculo, no chão. Ao final da história, os alunos contaram experiências de seus avós e relembraram histórias que eram contadas por eles. Ainda, como parte dessa atividade, cada aluno pintou em um retalho 30 x 40 uma lembrança de sua história. Os retalhos foram costurados formando uma colcha que passou a ser utilizada como recurso para contação de histórias.

         Na imagem à esquerda, foi feita uma contação de lendas urbanas na livraria Café e Letras. Nesse dia, preparamos o espaço coffee break para o final do evento. No chão, colocamos a colcha de retalhos produzida pelas crianças. Para a contação das lendas urbanas, nós apagamos as luzes da livraria e as crianças utilizaram uma lanterna. Cada criança contou uma lenda urbana. Foi uma experiência interessante, pois as crianças do 5º ano gostam muito de histórias de assombração. Antes do coffe break, fizemos o amigo livro, cuja dinâmica é ganhar e receber um livro – um grande estímulo para estimular o hábito de leitura.

         Essas são somente algumas das possibilidades e estratégias para a contação de histórias. Para tanto, a literatura infantil abre um leque de oportunidades para a confecção de materiais que podem ser utilizados nesse momento. A inovação e a criatividade são, portanto, a roupagem que traz a aparência na hora do faz de conta.

 

  1. Considerações finais

Evidentemente, as crianças adoram ouvir e contar histórias. É o momento que o silêncio paira sobre a sala de aula. O público infantil espera curioso por um detalhe, um fato, por um novo personagem. A literatura infantil coloca a contação de histórias como uma arte; um agente transformador de interiores. Para tanto, partindo da experiência profissional, é fato que esse trabalho traz resultados positivos para a mudança de comportamento, indisciplina na sala de aula além de fomentar o hábito de leitura. Se o professor tem uma turma indisciplinada e quer resolver o problema, conte histórias para ela. Se o problema do educador é o baixo interesse dos alunos pela leitura, conte histórias para eles. Com a contação de histórias, as crianças incorporam novas formas de ser, novas atitudes e, portanto, novos valores.

  1. Referências

 

ABRAMOVICH, F. Literatura infantil: gostosuras e bobices. São Paulo: Scipione, 2004.

BETTELHEIM, Bruno. A psicanálise dos contos de fadas. 34º ed. Rio de Janeiro/São Paulo: Paz e Terra, 2017.

BRITO, T. A. de. Música na Educação Infantil: propostas para a formação integral da criança. São Paulo: Peirópolis, 2003.

CALDIN, C. F. A oralidade e a escritura na literatura infantil: referencial teórico para a hora do conto. Florianópolis. Encontros Bibli: revista eletrônica de biblioteconomia e ciência da informação, n. 13, p. 25-28, 2002.

COELHO, Nelly Novaes. O conto de fadas – símbolos, mitos, arquétipos. São Paulo: Difusão Cultural do Livro, 2003.

HUNT, Peter. Crítica, teoria e literatura infantil. Tradução Cid Knipel. São Paulo: Cosac Naify, 2015.

LIMA, E. A. de; VALIENGO, A. Literatura infantil e caixas que contam histórias: encantamentos e envolvimentos. In. CHAVES, M. (Org.). Práticas pedagógicas e literatura infantil. Maringá: Eduem, 2011. p. 55-67.

COSTA, P. B. A. F.

BAPTISTA, F. H.

* Formada em Letras e Pedagogia pela Universidade Federal de Rondônia. Pós-Graduada em Psicopedagogia Clínica e Institucional pela UNINTER. Pós-Graduada em Libras pela Faculdade de Santo André – Vilhena/RO. Orientadora Educacional do Instituto Federal de Rondônia.

* Formada em Economia pela Universidade Federal de Mato Grosso-UNEMAT. Pós-Graduada em Gestão Empresarial e Recursos Humanos pela Faculdade da Amazônia-RO.

Deixe um comentário