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PEDAGOGO NÃO FORMAL: EXPERIÊNCIAS DE ATUAÇÃO EM UMA INSTITUIÇÃO FORMATIVA NÃO ESCOLAR DE HUMAITÁ- AM

PEDAGOGO NÃO FORMAL: EXPERIÊNCIAS DE ATUAÇÃO EM UMA INSTITUIÇÃO FORMATIVA NÃO ESCOLAR DE HUMAITÁ- AM

*Sara Nascimento da Silva

*Marlene Schüssler D’Aroz

RESUMO – O artigo em questão visa analisar a atuação do pedagogo em um espaço não-formal na cidade de Humaitá-AM, a partir de resultados de um projeto do Programa de Iniciação Científica-PIBIC desenvolvido em 2022-2023. A metodologia usada foi a roda de diálogo. Os resultados indicam que em Humaitá, apenas uma instituição formativa não escolar tem pedagogos na sua equipe de profissionais atuando em todas as situações que envolvem a criança, a escola e a família da comunidade de inserção.

Palavras-chave: Pedagogia. Pedagogo não formal. Educação.

ABSTRACT – The article in question aims to analyze the work of the pedagogue in a non-formal context in the city of Humaitá-AM, based on the results of a project of the Scientific Initiation Program developed in 2022-2023. The methodology used was the dialogue circle. The results indicate that in Humaitá, only one non-school training institution has pedagogues on its team of professionals working in all situations involving the child, the school and the family of the insertion community.

Keywords: Pedagogy. Non-formal educator. Education.

INTRODUÇÃO

A Educação vem sendo (re)conceitualizada frequentemente, por um lado, no quadro das novas exigências da “Sociedade do Conhecimento”, da “Sociedade da Informação”, por outro, a educação como “direito social” ou um “direito de cidadania” frente à necessidade de preparar o indivíduo para a autonomia, mas também encaminhá-lo para o mercado de trabalho, no entanto, é imprescindível o conhecimento básico acerca da leitura e escrita (MOLINA, 2003). Esta compreensão tem sido discutida retomando a concepção de Educação Social sem fugir da Pedagogia que está diretamente ligada ao estudo das práticas educativas, e estas acontecem também em espaços extraescolares.

Na atualidade, a Educação Social apresenta significativos avanços e impensáveis até poucos anos atrás. Por outro lado, é ainda comum atribuir os benefícios da educação social às pessoas necessitadas, quando “educação social se faz nos diversos contextos de vida” (CANASTRA, 2009, p. 6). Nessa mesma linha de pensamento está o Pedagogo Social, figura que surge da necessidade de suporte e acompanhamento social de públicos diferenciados e, desde então, vem tentando se enquadrar numa nova necessidade educativa, embora com restrita participação em alguns espaços não formais.

É inegável que em todos os contextos educativos, o professor pedagogo tem contribuído e desafiado. Embora desafiado, é importante destacar que o pedagogo tem, ao longo dos anos, conquistado outros campos de atuação, o não escolar. Destarte, ao refletir sobre a atuação do pedagogo em espaços sociais não formais, compreendemos o que determina a RESOLUÇÃO CNE/CP Nº 1, DE 15 DE MAIO DE 2006, que instituiu as Diretrizes Curriculares Nacionais – DCN para o curso de Licenciatura em Pedagogia, assegurando a aprendizagem e desenvolvimento de um público que por diversas razões não pode frequentar uma escola na idade certa, e ainda, receber educação que lhe é de direito, conforme determina a Constituição Federal de 1988, art. 205 que diz: “A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”.

Esse direito é uma garantia fundamental que busca promover o pleno desenvolvimento das pessoas, preparando-as para o exercício da sua cidadania e qualificando-as para o trabalho. Para efetivar esse direito, são adotadas diversas medidas e ações que envolvem o estado, a família e a sociedade como um todo. O estado tem o dever de criar um sistema educacional que assegure o acesso e a permanência de todas as crianças e jovens na escola. Tal afirmação implica na obrigatoriedade e universalidade da educação, garantindo que todas as pessoas tenham a oportunidade de aprender, independentemente de sua idade, gênero, etnia, classe social, entre outras características. Para isso, são estabelecidas leis e políticas educacionais que visam garantir que a educação seja um direito acessível a todos.

De acordo com Nóvoa (2022, p. 3), “se a educação é uma atividade que se reveste de sentido social, então a prática deve ser efetivada nos vários espaços e tempos educativos”. Com isso, o trabalho do professor está longe de ser uma tarefa fácil. No caso de uma instituição social, as maiores dificuldades encontradas no trabalho dizem respeito à expressiva demanda em atender crianças e jovens com dificuldades diversas, muitas destas dificuldades resultam da exposição a violências pela família e pela própria sociedade.

Na visão de Santos, Costa e Nunes (2017, p. 68), “no contexto escolar, o pedagogo é o profissional docente e ou administrativo que atua próximo ao aluno e tudo o que diz respeito a ele”. Já em espaços não escolares, atua com os orientadores sociais nos planejamentos realizados dentro dos serviços de convivência.

De acordo com Gohn (2004), a educação formal é ofertada no território das escolas, instituições regulamentadas por lei e organizadas segundo diretrizes nacionais. Já os territórios da educação não formal, localizam-se em contextos que acompanham as trajetórias de vida dos grupos e indivíduos, fora das escolas, em locais informais, com características diversas, cuja intencionalidade é um elemento importante e diferenciado.

 Acompanhando as transformações sociais, econômicas e políticas ocorridas nos últimos anos na sociedade, observa-se um aumento significativo na existência de espaços educacionais distintos das escolas tradicionais, conhecidos como espaços não formais de educação. Esses espaços, impulsionados pela filantropia, buscam alcançar aqueles indivíduos que estão à margem de qualquer processo educativo, inclusive dentro do contexto familiar, muitas vezes privados até mesmo desse direito fundamental que lhes é inerente.

Os espaços não escolares de atuação do pedagogo mais comuns são: o sistema penitenciário com a Educação de Jovens e Adultos-EJA e outras atribuições; a educação hospitalar no atendimento de crianças em idade escolar e hospitalizadas para acompanhamento prolongado da saúde; em museus; centros culturais que oferecem programas educativos e atividades pedagógicas para os visitantes; espaços de recreação e lazer; parques temáticos; centros de entretenimento-acampamentos; empresas; Organizações Não Governamentais (ONG); editoras; empresas midiáticas; clubes de futebol; Centros de Referência Social de Saúde da criança e famílias (CRAS; CREAS), entre outros. Os pedagogos não formais podem ser contratados por essas instituições para desenvolver e implementar programas educativos, criar materiais pedagógicos, planejar visitas guiadas e coordenar oficinas que relacionem o conteúdo, desenvolver projetos com práticas educacionais (LOSS, 2015, p. 68). Nestes espaços, os pedagogos podem desempenhar papel fundamental planejando e conduzindo oficinas, cursos, palestras e outras atividades que promovam o acesso ao conhecimento e estimulem o desenvolvimento pessoal dos participantes.

Estudos (GOHN, 2004) indicam que algumas empresas e organizações reconhecem a importância do profissional pedagogo para desenvolver habilidades e competências dos colaboradores, uma vez que são responsáveis pelos treinamentos, workshops e programas de capacitação que visam o aprimoramento profissional e pessoal dos funcionários.

Dos contextos de atuação não formais do pedagogo citados acima, as ONGs são as que mais empregam o pedagogo, cuja função é contribuir no processo escolar dos atendidos, na construção de projetos pedagógicos, captação de recursos, qualificação e a capacitação profissional como meio para a aquisição de renda para manutenção da instituição. As ONGs são entidades sem fins lucrativos que desenvolvem ações em diversos setores, principalmente com ações sociais.

Partindo dessa premissa, compreendemos que a formação do pedagogo para atuar também em espaços não formais se faz urgente, bem como a valorização deste profissional e a conscientização da fundamental importância da sua presença e atuação nos diferentes contextos.

O município de Humaitá, situado no Sul do estado do Amazonas, apresenta importância geográfica e estratégica na região devido a sua localização próxima a cidade de Porto Velho, capital de Rondônia, o que contribui para sua conexão com outras regiões do país. Em Humaitá, o pedagogo é conhecido e compreendido como professor de sala de aula, no atendimento escolar de crianças.

Diante desta afirmativa, ressalta-se a relevância de investigar a atuação do pedagogo não escolar e com isso ampliar possibilidades de atuação para esse profissional em Humaitá. Assim sendo, esta investigação partiu dos seguintes questionamentos: Quais instituições educativas não formais empregam um pedagogo em Humaitá-AM? Quais funções desempenha esse Pedagogo?

A fim de responder as questões supramencionadas, este artigo tem como objetivo apresentar experiências de uma pedagoga que atua na ONG Cáritas, organismo da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB).  No Brasil, a Cáritas opera por meio de uma rede composta por cento e oitenta e sete organizações membros distribuídos em doze regiões e cinco articulações. A equipe da Cáritas é composta por um coordenador, dois pedagogos e duas educadoras, que trabalham juntamente com auxiliares dedicados. Na instituição oferecem assistência a um grupo de sessenta indivíduos, incluindo crianças e adolescentes com idades entre seis e quatorze anos. Esse público reside num conjunto habitacional no município de Humaitá.

A metodologia utilizada para este artigo foi a roda de diálogo baseada na proposta dialógica de Freire (1996). Participaram da roda a pedagoga, as educadoras sociais, o coordenador e as pesquisadoras autoras deste texto.

Para tanto, o presente artigo apresenta-se assim estruturado: uma introdução, indicando os principais encaminhamentos, na sequência, os resultados, análise e discussão. Por fim, as considerações finais e as referências investigadas.

APRESENTAÇÃO DA EXPERIÊNCIA VIVENCIADA

O texto a seguir descreve a experiência com os profissionais da Cáritas, em especial, com a pedagoga daquela instituição.

Resultados, análise e discussão

Ao longo do projeto, em Humaitá-AM, foram investigadas dezessete instituições não escolares de atuação do pedagogo. Estas instituições baseiam-se em experiências de grandes cidades e capitais do país. Do montante investigado, nove foram contatadas por telefone e oito foram realizadas visitas presenciais. Com as visitas, constatou-se que apenas uma instituição, a Cáritas, tem na sua equipe de trabalho uma pedagoga que atua na função de orientação e supervisão de crianças escolarizadas, é sobre esta pedagoga que serão descritas as experiências vivenciadas com o público atendido.

Pedagoga e a Cáritas Diocesana de Humaitá-AM

A Cáritas, conforme mencionado acima, foi a única instituição com pedagogo na equipe. Sua missão é promover a solidariedade tanto em âmbito nacional quanto internacional, visando atender às comunidades afetadas por desastres socioambientais e aquelas que se encontram em situação de vulnerabilidade. Além disso, a Cáritas dedica-se, incansavelmente, ao trabalho de construção de comunidades mais seguras e resilientes (CARITAS HUMAITÁ, 2023).

Durante a visita realizada por meio de uma roda de diálogos, foram discutidos diversos temas, incluindo o propósito do projeto que consiste em investigar a atuação do pedagogo em ambientes educativos informais. Durante a discussão, foi relatado pela equipe da Cáritas que atualmente existem dois pedagogos na equipe de trabalho, porém um deles desempenha papel de educador social. Naquele momento, o coordenador da organização ressaltou a necessidade de mais um pedagogo para se juntar à equipe, uma vez que, esse profissional é responsável pela prática pedagógica. Além disso, ele acompanha o público atendido nas escolas da comunidade, presta auxílio nas tarefas escolares e atividades complementares, organiza eventos tanto dentro quanto fora da comunidade e contribui nas interações com as famílias, incluindo encontros e reuniões. Sua presença se faz fundamental em todas as situações envolvendo a Cáritas, diz o coordenador.

De acordo com Franco (2008), além de investigar a ação educativa, o trabalho pedagógico desenvolvido pelo pedagogo deve ter como um dos focos essenciais, o fazer educacional não só das escolas e de seus professores, mas das diversas instituições com possibilidades educativas e práticas que possam ir se transformando e se adequando às novas condições que vão sendo construídas (FRANCO, 2008, p.79).

Delors (2010), no seu pilar “Aprender a fazer” entende que a educação deve promover a ação. Ela é uma forma de intervir no mundo. Indo além, diz que:

Além da aprendizagem continuada de uma profissão, convém adquirir, de forma mais ampla, uma competência que torne o indivíduo apto para enfrentar numerosas situações, algumas das quais são imprevisíveis, além de facilitar o trabalho em equipe que, atualmente, é uma dimensão negligenciada pelos métodos de ensino (DELORS, 2010, p 13).

A pedagoga relatou que não se imaginava atuando em uma ONG, uma vez que, na universidade, durante a graduação de Pedagogia, aprendeu e se preparou para atuar em sala de aula como docente. Para a pedagoga, a experiência foi inicialmente, desafiadora, porém, com o passar do tempo foi se adaptando às necessidades da instituição e das crianças frente às tarefas escolares entendendo a importância da sua contribuição no aprendizado deste público.

Em seu relato, a pedagoga descreveu as experiências com as crianças na comunidade, a parceria com as suas famílias, os eventos integrativos, os diferentes projetos e iniciativas envolvendo as crianças que para ela faziam muito sentido a presença e atuação de um pedagogo. Ressaltou que algumas atividades eram uma extensão da sala de aula, experiências que somente eram possíveis concretizar com projetos extraescolares. O aprendizado proporcionado no espaço Cáritas era para a pedagoga a maior universidade, pois já não conseguia mais se imaginar fora daquele contexto, atuando em sala de aula convencional de uma escola.

De acordo com a pedagoga, além das contribuições referenciadas acima, das aulas de violão, artesanato, horta, o foco principal está no apoio educacional, principalmente no reforço escolar dos componentes curriculares como matemática e português.

No relato dos demais integrantes da equipe, ao longo dos anos, o trabalho da Cáritas tem se mostrado essencial para o desenvolvimento das crianças e da comunidade. Por meio de seus projetos, eles proporcionam aprendizados diversos, que muitas vezes não estariam acessíveis por meio dos recursos familiares disponíveis. Dessa forma, a instituição desempenha um papel crucial na prevenção do trabalho infantil, no combate ao envolvimento com drogas, na redução da permanência nas ruas e no abandono escolar.

A proposta de trabalho da Cáritas é comum às propostas de muitas Organizações Não Governamentais envolvidas com famílias e comunidade. No entanto, afirma ser importante para aquela comunidade porque está atenta a efetivação dos direitos da criança por entender que eles refletem na escola e na família. Um pedagogo nesses espaços, não atua como docente o qual é formado, mas como o profissional que tem uma visão de todo o processo educativo desenvolvido numa e para a comunidade, envolvendo todos.

Considerações finais

O texto em questão objetivou apresentar parte dos resultados de um projeto de Iniciação Científica desenvolvido no segundo semestre de 2022 e concluído no primeiro semestre de 2023, cujo enfoque destaca a experiência de atuação de uma pedagoga em uma ONG, em Humaitá-AM. O projeto inicial previa, além de investigar a atuação do pedagogo não escolar, ampliar os espaços de atuação do pedagogo para além da sala de aula.

Durante o estudo imersivo, constatou-se que a maioria dos espaços investigados não havia pedagogo em sua equipe, e muitos deles sequer sabiam que esse profissional poderia atuar fora do ambiente escolar. Em alguns espaços ficou evidente na fala de seus representantes a importância e a necessidade da atuação desse profissional. Isso ocorre, na sua maioria, porque o público atendido nessas instituições frequenta a escola e apresenta dificuldades na aprendizagem e, quando as dificuldades não forem sanadas, podem interferir na concretização do sonho e projetos de vida de muitas crianças, que segundo relatos durante a roda de diálogos, muitas vezes estão relacionados a atividades extracurriculares, como escolas de futebol, Pelotão Mirim e Bombeiro Mirim investigados em Humaitá-AM.

As lacunas identificadas pela falta do profissional pedagogo em algumas instituições educativas não escolares, reafirmam a necessidade de ampliar a discussão sobre a temática, especialmente no âmbito das universidades, nos cursos de Pedagogia, bem como sobre a formação do pedagogo, de modo a melhor prepará-lo para atuar em contextos não escolares.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Conselho Nacional de Educação. Conselho Pleno. Resolução CNE/CP Nº 1, de maio de 2006. Institui Diretrizes Curriculares Nacionais para o Curso de Graduação em Pedagogia, licenciatura. Diário Oficial da União, Brasília, n. 92, seção 1, p.11-12, 16 maio 2006.

CANASTRA, F. O perfil formativo-profissional do(a) educador(a) social – Uma experiência de investigação a partir do enfoque biográfico-narrativo. Revista Iberoamericana de Educación, 2009.

GOHN, M. G. A educação não-formal e a relação escola-comunidade. Revista ECCOS, no 2, vol. 6, Dez 2004, p. 39-65.

HUMAITÁ-AM, Caritas Diocesana. 2023.

LOSS, A. S. Pedagogia Hospitalar: Um Campo De Atuação Do Pedagogo. In: XII Congresso Nacional de Educação – Formação de Professores, Complexidade e Trabalho Docente, 5. Curitiba. Anais… Curitiba: PUCPR, 2015. p. 33065 – 33073. Disponível em: https://educere.bruc. com.br/arquivo/pdf2015/16100_7237.pdf. Acesso em: 11 jul. 2022.

MOLINA, J. Dar (la) palabra. Deseo, don y ética en educación social. Barcelona: Gedisa, 2003.

NÓVOA, A. Escola e professores: proteger, transformar e valorizar. Colaboração Yara Alvim. Salvador-Bahia, 2022.

SANTOS, J. D. C; COSTA, A. R. L; NUNES, A. O. O Pedagogo no âmbito da assistência social. Revista Educação & Linguagem. São Paulo. v. 4, n. 2, p. 60-76. 2017. Disponível em: https://www.fvj.br/revista/wp-content/uploads/2018/03/5_EDUC_20172.pdf. Acesso em: 11 jul. 2022.


* Graduanda de Pedagogia Pela Universidade Federal do Amazonas-UFAM. E-mail: Saranaveka2@gmail.com

* Licenciada em Pedagogia. Pós-Doutora em Educação. Doutora e Mestra em Educação (UFPR). Docente do Curso de Pedagogia da Universidade Federal do Amazonas-UFAM. E-Mail: marlenedaroz@ufam.edu.br

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