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Sobre o filme “Um homem bom” e as decisões que tomamos em nossa história de vida

Décio Luciano Squarcieri de Oliveira* e Fernanda Gabriela Soares Santos**

publicado em 07/05/2009

 

Sei que vi um dia a longa, a inútil guerra

Vi sorrir nesses cansados olhos, um orgulho triste.” Mario Quintana 

 

Fernanda Gabriela Soares dos Santos tem licenciatura Plena pela Universidade Federal de Santa Maria. Especialista em Gestão Educacional/UFSM, Mestranda em Educação/UFSM, Professora da Rede Municipal de Formigueiro – RS, Membro do Grupo de Estudos e Pesquisas em Imaginário Social – GEPEIS – UFSM. fernandagssantos@yahoo.com.br

Todos sabemos que o Holocausto produziu na humanidade marcas até hoje muito significativas e algumas, arriscaríamos até a dizer, caros leitores, mal-resolvidas. Tragédia estúpida para todos nós, a morte em massa nunca tem uma explicação plausível. Ainda que boa parte da humanidade concorde com a estupidez, sabemos que no mundo inteiro ainda existam adoradores da figura de Hitler.

 

 

De uma maneira ou outra, em certa época de nossas vidas, elegemos nós mesmos nossos ídolos. Mesmo que para nós pareça difícil acreditar que alguém idolatre a figura de um líder negativo, vez que outra ouvimos falar de algum grupo que assassinou em algum lugar movido por raiva xenofóbica.

Para MORIN (2003, p.97):

 

O etnocentrismo e o sociocentrismo nutrem xenofobias e racismos e podem até mesmo despojar o estrangeiro da qualidade de ser humano. Por isso, a verdadeira luta contra os racismos se operaria mais contra suas raízes ego-sócio-cêntricas do que contra seus sintomas.

 

 

O convite aqui para assistir ao filme também é o convite para uma inquietação que vai além. A mesma inquietação que nós, professores de filosofia, de um modo geral e não podemos falar sobre todos, temos a respeito da figura do filósofo Martin Heidegger.

 

 

Como o amante de uma judia se torna professor aliado de um governo que quer exterminar com judeus? Ainda que alguns pesquisadores defendam a tese de que o referido filósofo acreditava que apenas organicamente ao regime poderia lutar contra ele, continua fulgurando na História do cotidiano como uma questão que não quer calar… Ainda é

Décio Luciano Squarcieri de Oliveira é Graduado em História – Licenciatura Plena pela Universidade Federal de Santa Maria. Especialista em História do Brasil/UFSM, Mestrando em Educação/UFSM, Professor Pesquisador I da Universidade Aberta do Brasil – UAB/UFSM, Membro do Grupo de Estudos e Pesquisas em Imaginário Social – GEPEIS – UFSM. decioluciano@yahoo.com.br

uma questão em aberto e que dificilmente encontraremos a resposta cabível, já que os principais envolvidos estão mortos.

 

 

A esse respeito, afirma MORIN (2003, p.70):

 

O século XX foi o da aliança entre duas barbáries: a primeira vem da profundeza dos tempos e traz guerra, massacre, deportação, fanatismo. A segunda, gélida, anônima, vem do âmago da racionalização, que só conhece o cálculo e ignora o indivíduo, seu corpo, seus sentimentos, sua alma, e que multiplica o poderio da morte e da servidão técnico-industriais.

 

 

Também no filme o protagonista passa por uma situação semelhante ao filósofo em questão: recebe o convite para trabalhar no governo. Embora a proposta pareça sedutora, há os riscos de participar de um regime do qual não se tem nenhuma identificação.

 

 

Para completar, o protagonista está passando por desafios pessoais. Cuida da mãe que já está em um estágio da velhice que necessita de cuidados um pouco mais atentos e mora na mesma casa que o protagonista e ainda possui dois filhos pequenos.

 

 

 

O casamento parece bastante morno, sua esposa, para completar embora não tenha tarefas externas, sublime as ocupações caseiras e factuais e procura refúgio na música. Os problemas da casa ou das crianças parecem não incomodá-la, uma vez que não se envolve com os mesmos. A música parece ter uma importância muito maior, naquele momento, em sua vida.

 

 

Seguido de diversos assédios de uma aluna extremamente atraente, o professor acaba deixando a família e se permitindo viver um grande amor. Aos poucos, a beleza física que outrora o atraíra, aos poucos, mostra-se um pouco vazia. O professor, gradativamente, perde o encontro por aquela que outrora o atraiu, e, numa daquelas decisões que temos que tomar de forma muito difícil ao longo de nossa vida, acaba aceitando o convite para participar de alguns trabalhos para o regime.

 

 

 

Segundo MORIN (2003, p.58): “O homem da racionalidade é também o da afetividade, do mito e do delírio (demens). O homem do trabalho é também o homem do jogo (ludens). O homem empírico é também o homem imaginário (imaginarius).”

 

 

Apoiado pela atual esposa, mas não sem se sentir culpado, uma vez que seu grande amigo e confidente é judeu e questiona todo o tempo sua participação. Também aqui várias questões são colocadas, pois, em como todos os regimes totalitários, o sistema vai tornando a vida para aqueles que nele não se adequam, cada vez mais difícil e obsoleta.

 

 

Ainda que, por diversos momentos, o protagonista tenha dificuldade de imaginar que as coisas possam ficar muito difíceis para o amigo, chega uma hora que ele sabe: ou ajuda o amigo a fugir ou o sistema vai matá-lo.

 

 

Merece uma atenção especial também a última cena do filme, quando o protagonista conhece de perto um campo de concentração. Quando presencia os rostos, os traços daqueles que o habitam. Cena forte, difícil, marcante. Caros leitores, o convite está feito. O filme, com suas angústias existenciais e seus índices de História, por si só, constitui-se em uma aula de Filosofia e/ou História.

 

 

Referências

MORIN, Edgar. Os sete saberes necessários à educação do futuro. SP: Cortez, 8 ed, 2003.

 

* Graduado em História – Licenciatura Plena pela Universidade Federal de Santa Maria. Especialista em História do Brasil/UFSM, Mestrando em Educação/UFSM, Professor Substituto do Departamento de Metodologia do Ensino – Centro de Educação – UFSM, Membro do Grupo de Estudos e Pesquisas em Imaginário Social – GEPEIS – UFSM. decioluciano@yahoo.com.br

** Graduada em Filosofia – Licenciatura Plena pela Universidade Federal de Santa Maria. Especialista em Gestão Educacional/UFSM, Mestranda em Educação/UFSM, Professora da Rede Municipal de Formigueiro – RS, Membro do Grupo de Estudos e Pesquisas em Imaginário Social – GEPEIS – UFSM. fernandagssantos@yahoo.com.br

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