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A Liquidez de Bauman: implicações para as práticas de pesquisa na contemporaneidade

A LIQUIDEZ DE BAUMAN: IMPLICAÇÕES PARA AS PRÁTICAS DE PESQUISA NA CONTEMPORANEIDADE

 

Andriza Machado Becker[*]

Andriza Machado Becker é graduada em Letras/Português e Literaturas. Especialista em TICs Aplicadas à Educação e Mestranda em Educação – PPGE/UFSM. E-mail: andrizabecker@gmail.com

Zygmunt Bauman nasceu no ano de 1925 na Polônia. Depois de ter artigos censurados no país, em 1968, emigrou para a Inglaterra, e deu início ao processo de reconstrução de sua carreira passando pelo Canadá, Estados Unidos e Austrália, até chegar à Grã-Bretanha onde, em 1971, tornou-se professor titular da Universidade de Leeds, cargo que ocupou por cerca de 20 anos. Por esta trajetória, o próprio cientista social considera-se um exemplo ao discutir as questões de identidade e pertencimento.

Em Modernidade Líquida apresenta-nos uma análise das transformações sociais ocorridas desde a modernidade à sua implicância nos discursos da contemporaneidade, ou seja, na chamada pós-modernidade. O autor utiliza termos designadores dos estados físicos da matéria (líquido e fluidez) para estabelecer analogia com a temporalidade, a forma e a instantaneidade com as quais os sujeitos moldam-se em relação a infinitas estruturas, nas quais as dissoluções dos laços afetivos e sociais são o centro da questão.

As considerações de Bauman têm sido base para muitos estudos nas áreas da sociologia, filosofia, linguagem, educação, literatura, dentre outras, por se propor a estudar, também, a origem da fragmentação que permeia as atividades e as formas de pensar – fato que implica diretamente na construção identitária.

O livro está dividido em Prefácio, intitulado “Ser leve e líquido”; e cinco capítulos que tratam de cinco categorias da experiência humana: Emancipação, Individualidade, Tempo/Espaço, Trabalho e Comunidade; além de um Posfácio, sob o título “Escrever; Escrever Sociologia” no qual o autor busca uma reflexão sobre o papel do sociólogo frente aos acontecimentos de ordem histórica, social e política.

Bauman concebe o pós-moderno como algo sob-rasura – já que os preceitos da modernidade que se baseavam na crença no progresso, razão e história universal, não nos servem mais. Nesse sentido, qualquer prática de pesquisa hoje deve partir da consideração de que o homem já foi parte de um sistema histórico que permitia a ideia de pertencimento a um organismo uno. Na atualidade, porém, ele é projetado de forma fragmentada, transformando-se em um híbrido cultural, e sendo obrigado a assumir várias identidades, dentro de um ambiente que é totalmente provisório e variável, estando sujeito a formações e transformações contínuas em relação às formas em que os sistemas culturais o condicionam, como elucida o autor:

As identidades parecem fixas e sólidas apenas quando vistas de relance, de fora. A eventual solidez que podem ter quando contempladas de dentro da própria experiência biográfica parece frágil, vulnerável e constantemente dilacerada por forças que expõem sua fluidez e por contracorrentes que ameaçam fazê-la em pedaços e desmanchar qualquer forma que possa ter adquirido (BAUMAN, 2001, p. 98).

Identidade, para Bauman, é entendida como um círculo de pertencimento, ao qual estamos inseridos ou não. No entanto, o grau de pertencimento de um sujeito a determinado círculo está sendo impelido pela massificação do pensamento humano. O acesso a uma cultura valorizada historicamente por blocos de poderes aponta para a rejeição de outras culturas que, devido ao não privilégio pela mídia de massa, acaba ocultando-se e vindo à tona, somente em situações de escolhas últimas, onde a noção de uma identidade individual se torna componente importante.

Como a forma de se relacionar com o outro se torna cada vez mais flexível, as experiências líquidas são sinônimas de um acúmulo de sentimentos não-realizados (frustrações), inclusive os espaços culturalmente indicadores de origem, de identificação primeira como família, vizinhança, escola, etc.

 Já a emancipação é caracterizada como sinônimo de liberdade e, o indivíduo se submete à sociedade para obtê-la e assim torna-se dependente desta sociedade. O movimento de individualização na atualidade implica outro significado do que àquele dos primeiros tempos da era moderna – quando emancipação significava o desvinculo da dependência, vigilância e imposição social.

Uma exemplificação apresentada, acerca da noção tempo/espaço, é o caso do arquiteto inglês George Hazeldon – idealizador de um projeto chamado Heritage Park, uma área de 500 acres de terra na África do Sul que se propõe a recriar um espaço que, conforme o arquiteto, ‘tínhamos no passado’, uma comunidade. Assim essa cidade “ideal” é a perfeita união de claustro e fortaleza – reflexo das conturbadas interpelações entre indivíduos. Ainda, a noção, mesmo que conturbada hoje, de comunidade é última ideia de uma vida melhor, é a sobra dos sonhos, assim a “comunidade é um bom argumento de venda” (BAUMAN, 2001, p.108).

Bauman retoma constantemente a expressão liquidez em seus textos, como “Amor Líquido”, “Vida Líquida” e “Comunidade”, para (re) afirmar que os laços humanos encontram-se completamente fragilizados, pois, nosso entendimento das noções de pertencimento, comunidade e identidade estão em constante mudança na modernidade-líquida – lugar onde a prioridade está nas relações em “redes”, tecidas ou desmanchadas com igual facilidade, desconstituindo a possibilidade de se manter laços a longo prazo.

  Bauman, em seus textos, põe em “xeque” noções e paradigmas apresentadas a nós há muito tempo. É uma leitura densa e complexa na qual o leitor deve estar desprendido da noção de sujeito unificado. No entanto é leitura obrigatória a estudiosos das diversas áreas do conhecimento que buscam uma produção e reflexão pautada no que de fato está acontecendo nas relações humanas.

                                                                                

Referência Bibliográfica:

BAUMAN, Zygmunt. Modernidade Líquida. Tradução de Plínio Dentzien. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editora, 2001. 258 páginas.

[*]é graduada em Letras/Português e Literaturas. Especialista em TICs Aplicadas à Educação e Mestranda em Educação – PPGE/UFSM. E-mail: andrizabecker@gmail.com

 

BECKER, A. M. . A Liquidez de Bauman: implicações para as práticas de pesquisa na contemporaneidade. P@rtes (São Paulo) , v. fev/12, p. 1, 2012.

 

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