Educação

A relação entre Trabalho e Educação: tensão entre a manutenção e a mudança do tecido social

Décio Keher Marques *

Marinaldo Felipe da Silva **

Gilson Divino Araújo da Silva ***

Resumo

Décio Keher Marques – * Professor de Filosofia do Magistério Federal do IFRO Campus Guajará-Mirim, Mestrando em Educação Escolar no Mestrado Profissional (UNIR). E-mail: decio.marques@ifro.edu.br

O trabalho e a educação intrinsecamente são historicamente apresentados ao homem. Pelo trabalho o homem altera a natureza que altera a si mesmo o que exige uma preparação. Cada vez mais cresce a cultura que predomina o interesse em transformar a pessoa para a eficiência na produtividade do trabalho e menos no desenvolvimento humano. A pesquisa utilizou-se da metodologia exploratória com ênfase bibliográfica e visa apontar os delineamentos na educação na tensão em manter o status quo e na mudança do tecido social.

Palavras-chave: Educação, Trabalho, Capitalismo, Política Educacional.

Resumen
El trabajo y la educación intrínsecamente se presentan históricamente al hombre. Por el trabajo el hombre altera la naturaleza que cambia a si mismo lo que exige una preparación. Cada vez más crece la cultura que predomina el interes en transformar a la persona para la eficiência em la productividad del trabajo y menos em el desarrollo humano. La investigación se utilizó de la metodologia exploratória com énfasis bibliográfico y apunta los delineamientos em la educación en la tensión em mantener el status quo y em el cambio del tejido social.

Palabras clave: Educación. Trabajo. Capitalismo. Política Educativa.

 

Introdução

Com o avanço de uma cultura voltada para a produção, cresce a busca pelos cursos técnicos e a diminuição de interessados em cursos de nível superior, principalmente nos cursos de licenciatura e da área das ciências humanas.

Marinaldo Felipe da Silva – ** Atualmente é PROFESSOR TITULAR na Universidade Federal de Rondônia/UNIR-RO e professor do Programa de Pós-Graduação em Educação Escolar-Doutorado/Mestrado Profissional da UNIR/RO. E-mail: felipe@unir.br

Em meio às leis voltadas para a educação no Brasil, em especial ao estipulado no Caput do art. 205 da CF 88 (BRASIL, 1988), encontra-se a intencionalidade da educação que deve ser voltada para a o exercício da cidadania e a capacitação para o mercado de trabalho, embora na prática o segundo objetivo ocupa o lugar do primeiro no aspecto de interesse e relevância ao sistema econômico vigente. Frente a tais fatos percebe-se o grande interesse de movimentação da economia, ao passo, que no sistema capitalista, inevitavelmente, pessoas tornam-se também mercadoria na medida em que não possui os meios de produção e resta-lhes apenas, no caso, venderem a sua força de trabalho. A consequência concreta desta coordenada, justamente, priva quem pertence à classe trabalhadora da formação de uma consciência crítica e mantendo-a na condição de explorado por meio da alienação do trabalho que visa o lucro dos detentores dos mais variados meios de produção. Qual deve ser o valor da força de trabalho? Na condição de ser vivo, o trabalhador dever receber os necessários para a sua subsistência e reprodução de sua capacidade de trabalho, ou seja, alimento, roupa, moradia, possibilidade de criar os seus filhos, formação para aprender a fazer bem feito os produtos etc.

No decorrer da história da humanidade dois elementos fundamentais se apresentaram intrinsecamente ao homem como construtor de si mesmo: o trabalho e a educação. Devido aos seus condicionamentos físicos o homem buscou adaptar a natureza à sua realidade. A busca e produção de alimentos, a construção de casa e agasalho, fazem do homem um ser que trabalha e, assim, altera a natureza com suas próprias mãos. O trabalho, assim como as demais atividades humanas, exige um processo de ensino, de meios e condições de elaboração de determinada atividade, de tal sorte, que o homem precisa ser educado para o trabalho.

Nos dias atuais esse processo se atualiza e se faz fortemente presente na realidade de nosso país, onde predomina o sistema (a cultura) capitalista. A busca pela produção agregada ao lucro de quem possui os meios de produção interfere bruscamente na educação brasileira. Com o crescimento da oferta trabalhista cresce também a oferta de cursos técnicos, de formação rápida e prática. A formação humana e crítica social ficam em segundo plano e o resultado, é óbvio, formam-se mais profissionais e menos cidadãos conscientes e humanos. Afinal, a força de trabalho torna a pessoa também em mercadoria. E a movimentação da mercadoria não depende dela mesma, senão, que seja totalmente passiva para ser controlada em vista da mais valia, conferida no espetacular entendimento marxista.

Gilson Divino Araújo da Silva – Professor de História do Magistério Federal do IFRO Campus Cacoal, Mestrando em Educação Escolar no Mestrado Profissional (UNIR). E-mail: gilson.silva@ifro.edu.br

Diante da hodierna realidade concreta no cenário brasileiro, vê-se de grande importância de compreensão aprofundado em torno das relações existentes entre a expectativa de acesso ao trabalho pelos estudantes da classe trabalhadora e os meios oferecidos pela educação nas políticas educacionais brasileiras, afim de garantir ao cidadão tal pleito. O que estende-se também, neste artigo, à percepção de novas alternativas para a valorização do ser humano como ser consciente e livre, não apenas como um meio ou peça de produção, oportunizando-lhe, em um primeiro momento, o esclarecimento a partir da condição de explorado(a) por meio de uma educação crítica e dialética desmitificando a educação como mera transição de conteúdos e, em um segundo plano, através da posse de tal esclarecimento da realidade concreta do educando, assim, encontre os fóruns adequados para tomar decisões na defesa de seus direitos e na resistência de permanecer passivo e imolado na conjuntura cruel do sistema burguês.

  1. Do conceito de trabalho

Diferente dos outros animais a espécie humana não se adapta a natureza, mas precisa adaptar a natureza às suas necessidades, como meio de sobrevivência. Esta adaptação se dá por meio de seu próprio esforço e do seu próprio trabalho. O homem é aquilo que faz de si mesmo, mas faz-se por meio de seu trabalho.

Segundo Abbagnano (2007) o trabalho é visto como atividade que exige certo grau de esforço e fadiga, justificando a visão bíblica, que vê o trabalho como maldição divina oriundo do pecado original. Esta mesma concepção pode ser encontrada entre filósofos antigos e medievais. Dentre aos filósofos modernos:

Hegel considerava o Trabalho como “mediação entre o homem e seu mundo”; isso porque, diferentemente dos animais, o homem não consome de imediato o produto natural, mas elabora de maneiras diferentes e para os fins mais diversos a matéria fornecida pela natureza, conferindo-lhe assim valor e conformidade com o fim a que se destina. (ABBAGNANO, 2007, p.976).

Neste sentido o trabalho pode ser visto como ação que visa à melhoria na qualidade de vida, fazendo com que os produtos naturais sejam adequados às necessidades humanas. O trabalho é um meio de sobrevivência.

Aceitando as contribuições da dialética hegeliana, Marx (MORILA; SENATORI, 2010) apresenta o trabalho não somente como meio de sobrevivência, mas como elemento de colaboração de atravessamento do homem de sua condição natural, por meio do trabalho o homem pode libertar-se e melhorar seus meios de vida.

O trabalho não só permite a sobrevivência do homem como também o transforma constantemente, historicamente, dialeticamente. O homem é, portanto, fruto de seu trabalho. Mais que isso, as relações de produção e as relações sociais entre os homens são resultado da conformação do trabalho em dado momento histórico. (MORILA; SENATORI, 2010, p.2).

O trabalho é um dos aspectos de maior relevância na distinção entre o homem e os outros animais por ser atividade essencialmente humana. O homem, dessemelhante dos outros animais, não se adapta à natureza, ou seja, não suporta as bruscas mudanças de temperatura, as tempestades e mesmo defender-se das demais espécies. Por sua vez, o homem precisa transformar a natureza para que atenda às suas necessidades.

Esta adaptação realizada na natureza é responsável pela sobrevivência e preservação da espécie humana e se dá manualmente de acordo com a realidade de cada indivíduo. A este processo de adaptação atribui-se o termo Trabalho, que é considerado um dos principais elementos na formação da essência humana.

Podemos, pois, dizer que a essência humana é o trabalho. A essência humana não é, então, dada ao homem, não é uma dádiva divina ao natural, não é algo que precede a existência do homem. Ao contrário, a essência humana é produzida pelos próprios homens. O que o homem é, é-o pelo trabalho. (SAVIANI, 2007, p. 154).

A origem dessa formulação em Marx.

Antes de tudo, o trabalho é um processo de que participam o homem e a Natureza, processo em que o homem, por sua própria ação, media, regula e controla seu metabolismo com a natureza. Ele mesmo se defronta com a matéria natural como uma força natural. Ele põem em movimento as forças naturais pertencentes à sua corporalidade, braços e pernas, cabeça e mão, a fim de apropriar-se da matéria natural numa forma útil para sua própria vida. Ao atuar, por meio desse movimento, sobre a Natureza externa a ele e ao modificá-la, ele modifica, ao mesmo tempo, sua própria natureza. Ele desenvolve as potências nela adormecidas e sujeita ao jogo de suas forças ao seu próprio domínio. (MARX, 1999, p. 142).

Nesta estreita relação entre o homem e o trabalho, percebe-se que estes caminham juntos em meio a um processo histórico, onde no decorrer de sua existência o homem constrói-se a si mesmo por meio do próprio trabalho. Diferente dos demais seres o homem pode alterar sua realidade pela sua capacidade de produção, produzir, neste sentido, não apenas por meio de recursos exteriores, mas principalmente produzir a própria essência.

Podemos distinguir os homens dos animais pela consciência, pela religião ou por qualquer coisa que se queira. Porém, o homem se diferencia propriamente dos animais a partir do momento em que começa a produzir seus meios de vida, passo este que se encontra condicionado por sua organização corporal. Ao produzir seus meios de vida, o homem produz indiretamente sua vida material. (MARX; ENGELS, 1974, p. 19).

Neste processo de auto formação, o homem também se revela, além de um ser histórico, como ser social. Por não conseguir se produzir sozinho, o homem se organiza em grupos para garantir sua existência por meio da produção. A partir do trabalho em grupo, ou sociedade, surge a divisão social do trabalho, e “em colaboração com o outro, o homem se produz e se faz ser social”. (JACOMINI, 2006, p. 119).

Segundo Marx (1999) o trabalho adquire um caráter social por meio de sua produção, ou seja, na troca de produtos mediados por um valor equivalente, a moeda, que são denominadas mercadorias e neste processo adquirem características do homem. Este, por sua vez, atribui às relações entre as pessoas uma forma material, à medida que ao seu trabalho é atribuído um valor, de forma que a relação entre as pessoas se materializam em coisas.

O homem, conforme dito, ao conhecer sua realidade busca melhorá-la por meio do trabalho, sendo assim, o trabalho é “uma atividade libertadora da humanidade, pois tem como característica propiciar a transcendência da condição natural”. (ASBAHR; SANCHES, 2006, p.58). Em Marx (1999) esse processo de trabalho é composto por três elementos que tratam do objetivo do trabalho, i. é, aquilo que pela ação do trabalho será transformado; do instrumento de trabalho, que trata da mediação entre o homem e o objeto a ser transformado pelo trabalho; do resultado do trabalho que apresenta-se nas seguintes configurações:

é sempre um valor de uso, isto é, tem sempre uma utilidade, por ser uma resposta às necessidades humanas. Porém disso não decorre que seja sempre algo material. As necessidades humanas não se restringem ao âmbito das necessidades físicas: além de se alimentar, morar, vestir, tornaram-se necessários para o ser humano o lazer, o saber, a arte, a religião etc. (ASBAHR; SANCHES, 2006, p.59).

Para que o trabalho atinja sua função libertadora, no caso, a finalidade e os meios de produção ou execução do trabalho devem estar sob o domínio do homem, e o resultado do trabalho deve pertencer-lhe, mas, segundo a comprovação de Marx, não é o que acontece na sociedade capitalista.

O homem, na sociedade capitalista, para garantir sua sobrevivência, obriga-se a vender sua força de trabalho, e em meio ao desenvolvimento da tecnologia torna-se servo das maquinas de produção. O trabalho deixa de ser um meio de libertação do homem para tornar-se uma forma de explorá-lo:

Assim, o trabalhador deixa de ser sujeito do processo de trabalho. O trabalho não é mais mediação para o homem ser livre e independente. No modo de produção capitalista, o trabalho subordina-se ao capital, tanto do ponto de vista da forma social (das relações sociais que se dão na sociedade) quanto da utilidade do trabalho (o trabalhador é apenas um anexo da máquina). (MENDES, 2006, p. 160).

O homem, neste sentido, tornou-se mais uma peça no processo de produção. Perde-se o conceito de homem como ser racional, psicológico e espiritual para tornar-se um meio de produção adquirido na mesma medida que as outras mercadorias. O homem passa a ser, não apenas o que faz de si mesmo, mas o que produz renda e desenvolvimento econômico da nação. O homem passa ser visto, não mais como um ser humano que, entre outras potencialidades, é capaz de produzir, mas apenas como um ser que produz esquecendo-se do humano.

Na compreensão dialética histórica materialista marxista, nota-se claramente, que de um lado há os detentores dos meios de produção do capital e do outro aqueles que só possuem a força de trabalho. No primeiro plano, já se verifica, que a análise de K. Marx (1999) funda-se sobre o trabalho. Nesta esteira, justamente partindo da ideia que o trabalho é a forma de intervir e mudar a natureza, ao que mais interessa neste reflexão, este modus facendi do hominis faber (homem trabalhador) conheceu na história a relação direta com o trabalho e a indireta, concomitantemente, a Educação torna-se potencializada e valorizada universalmente, na justa medida, da supremacia do trabalho alienado (indireta). Nesta esteira aponta Afrânio,

Marx é categórico a esse respeito ao afirmar que ‘o valor da força de trabalho é o valor dos meios de subsistência necessários para a manutenção do trabalhador’, ou seja, para que o conjunto da classe operária produza a sua força de trabalho é necessário que ela esteja viva, isto é, que se alimente, durma, se agasalhe e se reproduza. Sem isso não poderia voltar diariamente aos latifúndios e às fábricas do capital para lá vender a sua força de trabalho. (CATANI, 2011, p.29).

No formato de relação direta, que há ainda culturas humanas que o vivenciam, o resultado do labor humano acontece na íntegra aos seus agentes. Ou seja, o sujeito sai ao trabalho e, na medida que extrai o suficiente para o seu sustento, então poderá apropriá-lo diretamente. Enquanto, no formato de relação indireta com o trabalho, o sujeito sai ao trabalho, mas não lhe é permitido trazer o que produziu. Assim, a sua produção não está relacionada diretamente à sua necessidade; o resultado de sua produção não configura a sua posse e transforma-se em mercadoria que pode ser adquirido por outrem, na justa medida, que é colocada a venda pelo dono do empreendimento. Faz para os outros e gera o lucra para os outros. O termo outro, do Latim, é o alienus. No caso, o trabalho indireto, é o trabalho alienado, típico do sistema econômico capitalista. Pondera Afrânio, “no sistema capitalista, portanto, a força de trabalho humana é uma mercadoria. E como todas as coisas tornam-se mercadorias ao serem trocadas por produtos de igual valor, a força de trabalho torna-se também mercadoria ao ser trocada por dinheiro.” (CATANI, 2011, p.29).

Essa importância atribuída ao trabalho chega a nossa sociedade por meio das raízes históricas e sociais. Segundo Saviani (2003) o fato surge quando a produção assume a forma privada, ainda nos períodos escravista, medieval e feudal, havendo uma pequena classe de proprietários e a grande massa, que, visando à sobrevivência, dedicava-se exclusivamente ao trabalho como meio de sustendo à família e de seus senhores.

Embora com a mudança dos meios de produção, os traços históricos descritos por Saviani ainda é a realidade de muitos brasileiros que se mantêm aprisionados aos seus “senhores” sejam eles internos ou externos. Conforme descreve Paulo Freire (2011) habitualmente os trabalhadores explorados absolvem para si mesmo a postura de seu opressor, passando a fiscalizar o próprio trabalho e punir-se pelo não seguimento de ordens.

  1. Das reflexões sobre a educação

No decorrer da história do Brasil, sempre foram levantadas discussões acerca de métodos a serem implantados na educação escolar, embora na maioria destas permaneça em vigor o método tradicional, que dentre outras características, destaca-se pela “ênfase nos exercícios, na repetição de conceitos ou fórmulas na memorização visando disciplinar a mente e formatar hábitos”. (LUCHESI, 1994, p.57).

Com a predominância do método tradicional, a educação permanece como um meio de reprodução da sociedade, ou seja, busca-se inserir o educando numa realidade ditada como pronta e imutável, como um meio de reproduzir o já vivido pela geração anterior.  Segundo Libânio,

A ação educadora seria, pois, a transmissão às crianças, aos jovens e adultos, de princípios, valores, costumes, idéias, normas sociais, regras de vida, às quais precisam ser adaptados e ajustados. Educa-se para que os indivíduos repitam os comportamentos sociais esperados pelos adultos, de modo que se formem à imagem e semelhança da sociedade que vivem e crescem. (LIBÂNIO, 2002, p. 73).

Nessa forma de educação não seria interessante despertar nos alunos a autenticidade e criticidade, não exercendo, a educação, um papel libertador, mas torna-se alienadora visando a passividade do cidadão. Neste sentido a educação desempenha a função de impor limites por meio da reprodução, assim o estudante reproduz fórmulas, decora regras, copia textos, mas não desenvolve capacidade de interpretar a própria realidade a fim de transformá-la.

Os alunos aprendem com o professor, que transmite o conteúdo da mesma forma que lhe foi transmitido, dessa forma nem alunos e nem professores abrem-se para um posicionamento diferenciado frente à sociedade, reproduzindo continuamente a imutabilidade social.

Não há como esperar resultados novos de métodos antigos. Os estudantes se detêm, não primordialmente com a aprendizagem, mas com os resultados numéricos das provas e avaliações, pois é exatamente isso que lhes cobram. Exigem-se das escolas altos índices de aprovação, a escola cobra dos professores resultados imediatos, assim não se aprende a aprender, mas a reproduzir os conteúdos transmitidos, mesmo sem saber ao certo o que estão reproduzindo. Desse modo o aluno é aprovado para a etapa seguinte, cursando assim os nove anos da Educação Básica sem estarem, em muitos casos, preparados para a próxima etapa e muito menos para o exercício da cidadania.

Outro fator que se tem destacado no campo educacional é a influência do capitalismo. Com a elevação do interesse de desenvolvimento econômico, cresce a demanda de cursos técnicos e profissionalizantes, onde o objetivo principal é formar trabalhadores e não necessariamente cidadãos conscientes, preocupam-se mais na formação de mais mão de obra e menos cidadãos críticos e reflexivos.

Diante deste problema Paulo Freire (2011) em suas obras nos apresenta uma nova pedagogia, visando a libertação do homem deste estado de reprodutor da sociedade para tornar-se livre, e, consequentemente, um cidadão autêntico por meio da práxis, ou seja, por meio da “reflexão e ação dos homens sobre o mundo para transformá-lo”. (FREIRE, 2011, p.52).

A opressão ocorre pela tirada da liberdade do cidadão. Tira-lhe o direito da verdade imputando o princípio de que “esse mundo não se constitui na contemplação, mas no trabalho” (FREIRE, 2011, p.23), acreditando que a educação seja tarefa para desocupados, e não como um meio de crescimento e esclarecimento. O que Paulo Freire propõe é uma pedagogia conscientizadora para que haja a inserção do homem numa forma crítica de pensar o seu mundo, para que assim, por meio da práxis, possa transformá-lo, melhorando suas condições de vida.

Dermeval, a partir da concepção dialética materialista distancia-se da pedagogia freiriana e desenvolve um novo método de ensino, a Pedagogia Histórico-Crítica do Conteúdo.

Uma proposta pedagógica cujo ponto de referência, cujo compromisso, seja a transformação da sociedade e não sua manutenção, a sua perpetuação. Este é o sentido básico do termo pedagogia histórico-crítica. Seus pressupostos, portanto, são os da concepção dialética da história. (SAVIANI, 2003, p. 93).

A proposta de Saviani é, portanto, entender o problema educacional como um fato presente, mas não de forma isolada, e sim como consequência de um processo histórico que estaria ligado não somente a questões pedagógicas, mas principalmente questões políticas.

Seria a reprodução social objetivo de um sistema político alienador? Quais seriam seus objetivos? Levando em consideração que as escolas são estruturadas de acordo com o meio social em que se inserem e que é predominante a dinâmica capitalista em nossa contemporaneidade, sofreria a educação grande influencia, preocupando-se assim com a preparação para o mercado de trabalho mais que a preparação para o exercício da autonomia como cidadão.

Considerações finais

Não se pode negar a estreita relação entre o homem, o trabalho e a educação. O homem, popularmente definido como animal racional, encontra no trabalho os meios de sobrevivência e melhoria da qualidade de vida, o trabalho por sua vez precisa ser aprendido por meio de um processo de ensino, ou seja, o homem, dotado de razão, é conduzido ao trabalho por meio da educação.

Tanto o teórico da concepção libertadora, Paulo Freire (2011), quanto o da crítico-social dos conteúdos, Saviani (2003) apontam caminhos à pratica educadora distante dos interesses do sistema econômico capitalista. Seguem o entendimento dialético materialista, em torno da concepção do trabalho e apontam que a Educação não pode corresponder a mais uma mercadoria do sistema. Ao passo, que a educação deve-se guardar uma estreita relação com a real condição de autenticidade do sujeito e, na medida, que contrapõe a praticada pela Educação com viés capitalista, ao passo, que transforma-a em mais uma mercadoria, no caso, ela também é concebida para os outros, visa o lucro e prepara a pessoa afim de adquirir habilidades em vista de gerar uma produção maior. Nesta linha, estuda-se os conteúdos dos outros (opressor), realiza-se prática pedagógica dos outros, estabelece valores dos outros, aprova-se ou reprova-se conforme o interesse dos outros, inclusive sob o axioma infalível da meritocracia que, justamente, propaga a ideia que vence o melhor porque todos são iguais. Os outros, no caso, são os detentores dos mais variados meios de produção do capital. A educação caracteriza-se, segundo, Arthusser (1980), no aparelho ideológico do Estado para justamente manter a sociedade estamental de classes nos tempos hodiernos.

Esse processo de ensino e trabalho dá ao homem a possibilidade de viver como um ser social e político o que não anula a sua individualidade. O homem é um ser que constrói a sua própria essência, sendo assim aquilo que faz de si mesmo. Para Marx (1999) o homem, de fato, é o seu próprio construtor, portanto constrói-se por meio do seu trabalho. Contudo, a finalidade hodierna posta à educação, no caso, não visa preparar o educando para a vida em sociedade, ou mesmo para o mercado de trabalho garantindo-lhe a racionalidade técnica, mas sim conduzi-lo ao trabalho de forma com que não reflita a própria existência e a sua condição no mundo, para que assim não se incomode e não deseje alterar essa realidade.

REFERÊNCIAS

ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de Filosofia.São Paulo/SP: Martins Fontes, 2007.

ALTHUSSER, Louis. Ideologia e aparelhos ideológicos do Estado. 3ª ed. Lisboa: Presença, 1980.

ASBHR, Flávia da silva Ferreira; SANCHES, Ydeliz Coelho de Souza.Transformação Social: uma possibilidade da educação escolar? In PARO, Vitor Henrique (Org.) A teoria do valor em Marx e a educação. São Paulo/SP: Cortez, 2006.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado, 1998.

CATANI, Afrânio Mendes. O que é o capitalismo.São Paulo-SP: Brasiliense, 2011.

FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro/JR: Paz e Terra, 2011.

JACOMINI, Márcia Aparecida. O trabalho como finalidade da educação na Constituição de 1988 e na LDB de 1996: uma análise a partir da teoria do valor em Marx. In PARO, Vitor Henrique (Org.). A teoria do valor em Marx e a educação. São Paulo/SP: Cortez, 2006.

LIBÂNEO, José Carlos. Democratização da Escola Pública – A Pedagogia Crítico-Social dos Conteúdos.18.ed.São Paulo:EdiçõesLoyola,2002.

LUCKESI, Cipriano Carlos. Filosofia da Educação. São Paulo/SP: Cortez, 1994.

MARX, Karl. O Capital: Crítica da economia política. Rio de Janeiro/ RJ: Civilização Brasileira, 1999. Livro I. 2v.

MARX, Karl; ENGELS, Friedrich. Textos sobre educação e ensino. São Paulo/SP: Moraes, 1974.

MENDES, Valdelaine da Rosa. Reflexões sobre os conceitos de homem, liberdade e Estado em Marx e as políticas educacionais. In PARO, Vitor Henrique (Org.). A teoria do valor em Marx e a educação.  São Paulo/SP: Cortez, 2006.

MORILA, Airton Pereira; SENATORI, Regina Celia Mendes. Trabalho e Educação em Marx e Gramsci.In Revista RET – Rede de Estudos do Trabalho, Ano III, nº. 06, 2010. Disponível em <http://www.estudosdotrabalho.org/8RevistaRET6.pdf >Acesso em: 12 de dezembro de 2018.

SAVIANI, Demeval. Trabalho e educação: fundamentos ontológicos e históricos. In Revista Brasileira de Educação, v.12, nº. 34, 2007.

______. Pedagogia Histórico-Crítica. Campinas/SP: Autores associados, 2003.

 

 

* Professor de Filosofia do Magistério Federal do IFRO Campus Guajará-Mirim, Mestrando em Educação Escolar no Mestrado Profissional (UNIR). E-mail: decio.marques@ifro.edu.br

** Atualmente é PROFESSOR TITULAR na Universidade Federal de Rondônia/UNIR-RO e professor do Programa de Pós-Graduação em Educação Escolar-Doutorado/Mestrado Profissional da UNIR/RO. E-mail: felipe@unir.br.

*** Professor de História do Magistério Federal do IFRO Campus Cacoal, Mestrando em Educação Escolar no Mestrado Profissional (UNIR). E-mail: gilson.silva@ifro.edu.br

 

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