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A literatura infantil e as questões de gênero e sexualidade: problemáticas dentro das práticas

A literatura infantil e as questões de gênero e sexualidade: problemáticas dentro das práticas

Karoline Ribeiro Rabelo[*]

Rozane Alonso Alves[†]

Rozane Alonso Alves – Professora Dra Rozane Alonso Alves. Professora do Instituto de Educação, Agricultura e Ambiente – IEAA, da Universidade Federal do Amazonas – UFAM. Email: rozanealonso@ufam.edu.br

Resumo:  A proposta deste excerto é discutir a questão de gênero e sexualidade atrelado a literatura infantil.  Ressaltamos que as leituras e produções deste artigo fazem parte do projeto de extensão – PACE, intitulado: Gênero e Educação no contexto da literatura infantil vinculado a Universidade Federal do Amazonas – UFAM, aprovado para o ano de 2020/1. A projeto em tela conta com a parceria de escolas municipais de Humaitá- AM.

Palavras-chave: Literatura Infantil. Gênero. Sexualidade. Educação.

Children’s literature and gender and sexuality issues: problems within practices

Abstract: The purpose of this excerpt is to discuss the issue of gender and sexuality linked to children’s literature. We emphasize that the readings and productions of this article are part of the extension project – PACE, entitled: Gender and Education in the context of children’s literature linked to the Federal University of Amazonas – UFAM, approved for the year 2020/1. The project on screen has a partnership with municipal schools in Humaitá-AM.

Keywords: Children’s Literature. Genre. Sexuality. Education.

 

Palavras Iniciais

 É importante que apresentemos aos leitores e leitoras deste artigo, as propostas que constituem o projeto de extensão intitulado ‘Gênero e Educação no contexto da literatura infantil’. Para tanto, a proposta deste projeto extencionista vem buscando dialogar com os professores que atuam na rede municipal de ensino de Humaitá – AM, sobre as questões de gênero que vem se apresentando, nos últimos anos, com mais densidade no contexto de sala de aula.

Deste modo, buscamos investigar como as identidades de gênero tem se manifestado em instituições escolares públicas urbanas, especificamente no Município de Humaitá – AM, a partir da prática pedagógica dos professores, bem como se há evidências de trocas interculturais nas relações sociais entre alunos/as e professores/as no que se refere as questões de gênero.

O projeto vem buscando construir uma proposta metodológica, por meio de oficinas, palestras e seminários que problematize teórica e pedagogicamente (com estes/estas educadores/as) as identidades de gênero no contexto da escola pública urbana de Humaitá.

Assim, o artigo em questão, apresenta as discussões produzidas pelo grupo de trabalho sobre gênero e sexualidade no contexto da literatura infantil, especificamente, quando discutimos propostas teórica-metodológicas para o ensino da questões de gênero na escola pública.

A literatura infantil e as questões de gênero e sexualidade

Karoline Ribeiro Rabelo – Acadêmica do Curso de Pedagogia do Instituto de Educação, Agricultura e Ambiente – IEAA, da Universidade Federal do Amazonas – UFAM, Campus Humaitá. Email: karolrabelllo@gmail.com

Ao se pensar nas questões de gênero e de sexualidade dentro da educação infantil, é preciso compreender que a natureza desses questionamentos dentro da sociedade ainda não é vista com bons olhos. Trabalhar com uma temática problemática requer uma atenção e sutileza que os demais assuntos, aceitos pela sociedade, não requerem. Com isso, utilizar de instrumentos do cotidiano assim como artefatos culturais, passou a ser não somente um meio de se compreender, mas para além disso, uma via para transformar.

Para compreender o porquê de a literatura ser um recurso essencial dentro dos debates acerca de gênero e sexualidade, é preciso entender que todo comportamento dentro de uma sociedade tem uma base que se desenvolve e define como cada indivíduo deve estar posicionado dentro desta mesma sociedade. As civilizações, da qual todo o ser humano fez parte, em todos os períodos históricos, tem em sua construção, tradições, vivencias, culturas e práticas. Na verdade, quando se pensa em sociedade, seu desenvolvimento histórico e cultural, seu dinamismo, e sua construção mais crua, não passa despercebido como tudo isso se engloba e se firma em bases já pensadas que ditam como cada indivíduo devem pensar, agir e falar.

Com isso, assimila-se não somente o contexto histórico dentro de uma sociedade, mas as questões culturais que são resultados desse contexto e assim o que nasce a partir das construções existentes. A cultura, no entanto, é capaz de se modificar e se adaptar ao longo dos anos, como por exemplo, linguagem, comportamentos, necessidades e até mesmo os artefatos culturais como filmes, músicas e os livros. Todas essas mudanças influenciam os indivíduos que compartilham dessa cultura.

Trabalhando com aspectos constituídos culturalmente, Ramos (2008) defende que o que nós conhecemos como gênero e como ele próprio se constitui é algo adquirido culturalmente. O que definimos como feminino e masculino, o comportamento a ser adotado por ambos, o que devem vestir, onde devem ir e com quem devem se relacionar, são fundamentos construídos em cima de uma cultura, em sua maioria patriarcal e preconceituosa, por isso a dificuldade de se adentrar em discussões a valores que não estão presentes nos padrões consideráveis aceitáveis. Como a subjetividade feminina, a sexualidade, os papeis sociais do homem e da mulher. Tais vertentes não se diferenciam somente entre si, mas entre outros povos e outras culturais.

Um dos artefatos culturais defendidos por Constantina Xavier, são os livros. A literatura dentro de um processo para discussão e compreensão acerca da sexualidade e os gêneros. Como Filha (2014) afirma “Os artefatos culturais produzem significados, ensinam condutas às meninas e aos meninos estabelece a forma ‘adequada’ e ‘normal’ de viver a sexualidade, a feminilidade e a masculinidade”. Trazendo então discursos acerca de diferenças que são construídos ao longo dos anos. Como Simone Beauvoir traz na frase “Não se nasce mulher, torna-se mulher”.

 De acordo com Ramos (2008, p. 14)

As sociedades desenvolvem modos de controlar a linguagem como forma de dominar a produção discursiva. Essa vigilância sobre o que é dito e sobre quem diz revela a face normatizadora de nossa sociedade disciplinar, na qual a proliferação de obras literárias não está isenta do controle institucional […] textos e imagens das obras infantis selecionadas os saberes e poderes constituidores de relação de gênero e de concepção de família, sabendo que não há neutralidade nem mesmo naquelas gravuras que não um “inocente colorido” as livros infantis.

Por meio disto veio a problematização acerca das desigualdades de gênero e o papel dos indivíduos na sociedade dentro das literaturas infantis. O campo de exploração presente nos livros é tão rico e bem construído que cria possibilidades de articulações firmes e eficazes com as problemáticas sociais vigentes, a visão utilizada para discorrer uma história assim como a discussão que vem posteriormente dá ao leitor uma infinidade de novos caminhos a serem trabalhados numa perspectiva pedagógica, esta que por sua vez não fica restrita somente a sala de aula, mas todos os âmbitos sociais e culturais que um criança possa ter acesso.

Percebemos que as diferenças de gênero representadas em plataformas literárias ajudam a naturalizar divisões e desigualdades, por isso, compreender o conceito de gênero como condição social e não como dicotomia biologia é tão interessante e instigante no ponto de vista da pesquisa científica. A forma como as diferenças sexuais são representadas e valorizadas num dado ponto de vista da pesquisa científica é o que importa, pois, o gênero é uma ferramenta analítica política e social que procura superar o determinismo da biologia, valorizando as relações entre os seres (COSTA; SILVA, 2016, p. 264).

De acordo com a pesquisa de Costa e Silva (2016), acerca das questões de gêneros e sexualidade nos livros infantis foi possível fazer uma análise sobre a elaboração de tais livros.  Os papeis impostos pelas mulheres costumam em sua maioria adotar uma imagem de fragilidade e inocência, assim como pureza também, muitas vezes dependendo de uma figura masculina, está que por sua vez é retratada com força e virilidade, por hora dotado de honra e ora dotado de malícia, sendo aceito e adorado das duas formas. O fato é, que tal construção enfatiza o que quer reproduzir com tais mensagens, e os autores buscam fazer uma análise crítica acerca desta construção e de uma maneira pedagógica, trabalhar com tais livros de modo que não se perpetue uma reprodução, mas se obtenha uma exploração de conceitos novos, uma narrativa mais crítica e um desenvolvimento de uma visão diferenciada, já que como afirmam os autores, o como e o porquê são as vezes mais importantes do que o que se tem.

Enquanto Costa e Silva (2016) trabalham com a literatura e a sexualidade de forma mais analítica, Ramos adentra com uma discussão mais ampla acerca da diversidade presente nos livros infantis. O conceito de família nos livros infantis não traz de fato todos os aspectos que englobam seu significado, trazendo para debate não somente os papeis ‘feminino’ e ‘masculino’, mas sua relação no sentido familiar. Como Ramos (2008) traz “É sabido que, historicamente, as diferentes sociedades humanas geraram as mais diversas formas de associações entre indivíduos, segundo as relações de parentesco criadas por cada grupo” e com isso é possível ressaltar a idealização dos livros acerca das relações humanas e como elas supostamente devem ocorrer, deixando de fora todo um material histórico constituído com as mais diversas peculiaridades. Ou seja, as vertentes que englobam a sexualidade, as questões de gênero e seu desenvolvimento dentro da sociedade são, de fato, em sua grande maioria, aspectos não trabalhados dentro da literatura infantil, mas ainda sim encontradas no seu corpus.

Aprofundando-se agora para os fatores influencer, quando se trabalha com literatura infantil, e adentra na realidade das crianças fica perceptível que o controle que a sociedade projeta nos indivíduos não as descarta. Na verdade, quando Ramos faz uma retrospectiva acerca do sujeito infantil e do sujeito adulto, nota-se que o papel da criança era uma extensão dos adultos que a cercavam e não se limita a isso, desde os tempos antigos o controle e a dominância em cima das mesmas moldaram e ainda moldam seu comportamento, seus desejos e seus saberes. Com os avanços chegando em todos os âmbitos, há uma abertura para desenvolver questionamentos importantes, principalmente no ambiente escolar já que esta passa a ser um dos principais percutores de novas tendências e pensamentos. Em reflexão:

Para entendermos o que é ser criança, devemos então considerar as infinitas possibilidades de relações como o mundo que a cerca, é a partir destas relações que o sujeito infantil vai sendo formado, Outra mudança que ocorreu foi que a infância recebeu novas tarefas e o sujeito adulto mudou sua maneira de agir graças ao surgimento e ao ‘conselhos’ da Psicologia, da Pediatria, da Pedagogia, etc (RAMOS, 2008, p. 38).

Ou seja, por mais que os espaços tenham sido abertos e novos olhares tenham sido direcionados ao sujeito infantil é possível ver um vestígio muito forte de disciplina e controle. Essa ideia se reflete justamente nas dificuldades que os pesquisadores, professores e especialistas encontram em discutir assuntos cuja grande parcela sociedade não aprovam. Trazendo um fio tradicionalista, muitos livros abordados em sala de aula são de forma passiva, por parte dos alunos, e a sexualidade é um tabu que tem barreiras fortes, em decorrência disso como aborda Ramos (2008) a preocupação com a literatura não se limita em aprender a ler ou formar leitores, mas ensinar a capacidade de filtrar informações e criticar questões equivocadas acercada própria sociedade.

E com isso a integração que acontece entre a literatura e as problemáticas existentes na sociedade poderiam ser discutidas e infiltradas no conhecimento das crianças. É sabido que as questões de gênero e sexualidade estão presentes na literatura infantil, o que é necessário é uma leitura critica desses que costumam ficar nas entrelinhas, para então, não somente ler, mas reconhecer as diversidades dentro da literatura e abrir espaço para novas que falem realmente de maneira clara sobre as diversidades e as peculiaridades que existem nos indivíduos e na sociedade.

Referências

COSTA, Fábio Soares da; SANTOS, Andreia Mendes dos. Representação de gênero e leitura infantil: Paradidáticos em análise. Educação Por Escrito, Porto Alegre, v. 7, n. 2, p. 263-277, jul.-dez. 2016.

FILHA, Constantina Xavier. Gênero, corpo e sexualidade nos livros para infância. Educ. ver. no.spe-1 Curitiba, 2014.

RAMOS, Josiane Becker de Oliveira. A construção do gênero e da sexualidade na literatura infantil. 2008. Dissertação (Pós-graduação em Educação) – Universidade Federal do Paraná, Curitiba.

[*] Acadêmica do Curso de Pedagogia do Instituto de Educação, Agricultura e Ambiente – IEAA, da Universidade Federal do Amazonas – UFAM, Campus Humaitá. Email: karolrabelllo@gmail.com

[†] Professora Doutora em Educação, vinculada ao Curso de Pedagogia do Instituto de Educação, Agricultura e Ambiente – IEAA, da Universidade Federal do Amazonas – UFAM, Campus Humaitá. Email: rozanealonso@ufam.edu.br

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