Adilson Luiz Gonçalves Colunistas

PONTOS DE FUGA

Já perdi a conta das vezes que ouvi pessoas dizerem que gostariam de voltar no tempo e recomeçar suas vidas, com a lucidez e a sabedoria da maturidade.

Bem, é verdade que nem todos chegam lúcidos e sábios à maturidade. Alguns, aliás, insistem em não amadurecer, preferindo permanecerem “jovens” não no sentido espiritual, mas cultivando a irresponsabilidade por seus atos, sempre esperando que alguém  lhes “entenda” e tolere.

Mas além daqueles que gostariam de voltar ao passado para corrigir erros, optar por alternativas que não notou, ou descartou, também há os que querem que seu futuro seja previsto. Esses, de certa forma, abrem mão do livre-arbítrio, para seguir as orientações de videntes, pagas a preço de ouro, mas sem nenhum certificado de garantia. Assim, o ser humano perde muito tempo pensando no passado ou tentando prever o futuro, mas esquece de viver o presente.

“Como será o amanhã?… O que irá me acontecer?”, diz uma canção; “Esses moços, pobres moços: Ah se soubessem o que eu sei…”; afirma outra; “Devia ter amado mais…; complicado menos…; ter visto o sol se pôr…”, diz mais uma.

Pois é… Se a gente voltasse no tempo talvez não lançasse algumas pedras, não dissesse certas palavras, nem perdesse algumas oportunidades. Mas pensar assim só serve para distrair tristezas, esquecer frustrações, mágoas ou arrependimentos. Pode justificar, oportunamente, o presente, mas não necessariamente contribui para mudá-lo, nem o futuro.

Assim, nem sempre a gente fixa o olhar na linha do horizonte, qualquer que seja a direção, em busca de novas perspectivas: às vezes o que se quer são, apenas, pontos de fuga.

É preciso ter muito cuidado, pois isso pode virar um perigoso freio, uma neurose, uma mania! E daí para uma patologia é um passo.

Aí, pensei “com os meus botões”: o que eu mudaria em minha vida, se pudesse voltar no tempo?

Provavelmente eu evitaria algumas brigas, mas certamente “compraria” outras tantas, ou mais. Talvez eu expressasse mais minhas opiniões, em vez de deixar que os outros interpretassem meus pensamentos. Pode ser que eu me esforçasse em ser menos tímido, em ousar mais. É possível que eu tentasse outros caminhos profissionais, ou novos, dentro das mesmas profissões. Quem sabe me declararia a todas as mulheres que eu amasse, em vez “curtir” paixões platônicas, etéreas ou deletérias.

Mas sempre que eu acordo, pela manhã, e vejo o sono lindo e sereno da mulher que eu amo ao meu lado, tão perto de meu coração, do meu carinho e do meu desejo, eu entendo que essa tola regressão temporal poderia, sim, mudar o futuro! E talvez eu jamais a encontrasse! Com isso, não haveria meu filho!

Sendo assim, então, não! Eu não quero voltar ao passado! Dele eu só quero as boas lembranças e as lições para seguir em frente.

As tristezas, as amarguras, os erros, as frustrações fazem parte dele, sim; mas hoje, eu os entendo como pedras do caminho que trilhei para chegar àqueles que eu mais amo, que são meu melhor presente.

É por eles e com eles, lado a lado, que eu esqueço o que não vale a pena, e penso e acredito no futuro!

Pois é… Às vezes a gente lamenta demais o passado, fantasia demais o futuro, olha demais para o espelho, tudo para tentar focar o que mal se pode ver: devaneios, pontos de fuga. No entanto, esquece de notar quem está presente, ao nosso lado, bem próximo, verdadeira benção de Deus!

Adilson Luiz Gonçalves

Escritor, Engenheiro, Pesquisador Universitário e membro da Academia Santista de Letras

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