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Como lidar com a baixa freqüência escolar

Por Vicente Martins

publicado em 30/07/2006

Vicente Martins é professor da Universidade Estadual Vale do Acaraú(UVA), em Sobral

Como as escolas públicas e privadas podem lidar com a infrequência escolar, especialmente quando alunos e docentes faltam às horas-aula ou têm baixa frequência aos dias letivos?  Na jornada escolar, que entendimento devemos ter do período letivo? No presente artigo, pretendo responder as duas questões acima levantadas a partir das concepções sobre a frequência interpretadas à luz da Constituição Federal(1988) e da Lei de Diretrizes e e Bases da Educação Nacional(LDBEN), a Lei 9.394. promulgada em 1996.

  Comecemos, então, pelo artigo 206, da Constituição Federal(1988). Entre os diversos princípios enumerados no referido artigo, o primeiro refere-se à igualdade de condições para o acesso e permanência dos alunos na escola. Mais adiante, no artigo 208, o legislador, ao tratar sobre o dever do Estado com a educação,  determina que o mesmo será efetivado mediante várias garantias de acessibilidade à escola,  estabelecendo, como competência do Poder Público o recenseamento dos educandos no ensino fundamental, e outras ações como a de fazer-lhes a chamada e zelar, junto aos pais ou responsáveis, pela frequência à escola (§ 3º). Estas prescrições da Constituição Federal migraram, ipsis litteris, para a LDBEN.

O conteúdo do § 3º do artigo 208 da Constituição Federal é reproduzido, em 1996,  no artigo 5º da LDBEN. A Lei reafirma que cabe ao Poder Público zelar, junto aos pais ou responsáveis, pela frequência à escola. Portanto, aqui o dispositivo é mais aplicável para diretores, coordenadores e professores das redes estadual e municipal de ensino, enquanto agentes do poder público e, como os estabelecimentos privados de ensino seguem as orientações nacionais, o zelo pela frequência é uma tarefa também dos pais ou responsáveis.

A infrequência de professores e alunos aos estabelecimentos de ensino, aqui entendida como falta de frequência às horas-aula ou a baixa frequência aos dias letivo, fere, portanto, os ditames legais da Constituição Federal e da sua legislação correlata, a LDBEN.

         No artigo 12,  inciso VII, da LDBEN, cabe aos  estabelecimentos de ensino informar aos pais, responsáveis ou, mesmo aos alunos, quando na maioridade, sobre sua  frequência e seu rendimento acadêmico, bem como sobre a execução da proposta pedagógica ou projeto pedagógico do  estabelecimento de ensino.

Ainda no referido artigo 12, inciso III, cabe as instituições assegurarem o cumprimento dos dias letivos e horas-aula estabelecidas. Como sabemos, nos estabelecimentos de educação escolar, existem dias letivos e horas letivas ou horas-aula, duas categorias importantes do chamado período letivo. Por hora-aula, devemos entender o espaço de tempo estipulado para o desenvolvimento de uma aula, isto é o período em que o professor desempenha atividade docente com os alunos, em grupo ou individualmente. Em geral, a duração de cada Hora-aula é de 50 minutos.

No âmbito da jornada escolar, o dia letivo pode ser tomado como em duas acepções: a primeira, como de trabalho escolar efetivo. Isto quer dizer, como prescreve a LDBEN, que o dia letivo não compreende aqueles reservados às provas finais ou resultados de recuperação. Uma segunda acepção compreende que o dia letivo é aquele em que os alunos ocupam seu tempo em atividades relativas ao desenvolvimento do currículo, na escola ou fora dela (visitas, excursões ou viagens, desde que devidamente planejadas. Assim, quando o professor vai à escola, mesmo não ministrando horas-aulas, está ministrando (observe que estou repetindo o verbo no gerúndio) seus dias letivos.

Quanto à frequência ou infrequência escolar dos docentes, o que se deve entender, enfim, nesse particular, é que a frequência no âmbito escolar deve ser entendia como sinônimo de assiduidade, isto é, se efetiva, legalmente, quando o  docente: 1)  se faz presente constantemente no estabelecimento de ensino. 2)  não falta às suas obrigações; e 3)   se aplica, outrossim, quando o docente executa com tenacidade as suas tarefas acadêmicas (ensino, pesquisa, extensão, administração). Em substância, ser assíduo, ao pé da letra, como se pode sugerir da forma latina “assidùus”, é o docente está sempre presente, em corpo e espírito no estabelecimento de ensino.

O artigo 12, no seu inciso IV, diz que cabe às instituições de ensino a incumbência de velar (aqui, o verbo significa “cuidados, proteção a; tratar de, interessar-se, dedicar-se, zelar, proteger”) pelo cumprimento do plano de trabalho de cada docente (PTD).Grifaria o pronome cada para dizer que é da incumbência do estabelecimento de ensino interessar-se e zelar pelo PTD de cada docente.

 No caso das universidades, vale destacar o que prescreve o artigo 47 da LDBEN, em referência à educação superior,  referindo-se o ano letivo regular, ao determinar que é obrigatória a frequência de alunos e professores, salvo no caso da educação a distância.

Assim, a frequência é obrigatória, particularmente nos seguintes casos:  1)  quando se refere a uma obrigação imposta por  Lei, no caso a Lei 9.394 (LDBEN) e 2) no caso de pressão moral da comunidade universitária (docentes, alunos e funcionários).  Como imposição de Lei, no caso a LDBEN,  em geral, os docentes têm  obedecido efetivamente à Lei à medida que cada profissional de educação escolar cumpre, conforme sua carga horária de trabalho,  a tarefa de ministrar os dias letivos e hora-aulas.

No tirante à pressão moral, o que nos leva a evocar aqui uma questão de ordem ética, a verdade é que maioria dos docentes, em sala de aula, busca oferecer boas condições de ensino aos nossos alunos, de ofertar à comunidade um ensino de qualidade, um ensino voltado à aprendizagem do aluno, esforço traduzido, eticamente, como um caráter imperativo, na relação interpessoal professor-aluno que se impõe à consciência de cada profissional de educação escolar,  sem a necessidade de coerção física ou terrorismo psicológico por parte dos gestores escolares, diretores ou coordenadores dos estabelecimentos de ensino.

Uma última palavra é a seguinte: é papel dos estabelecimentos de ensino, quanto à frequência dos docentes às aulas, tomar, sempre, como guia de acompanhamento profissional, o que prescreve a LDBEN, diretriz importante para o trabalho escolar. O artigo da 13, da LDB, diz, entre as incumbências dos docentes (a rigor, os professores com cargos públicos ou contratados segundo as normas trabalhistas da CLT) está a de  ministrarem “dias letivos e horas-aulas estabelecidos, além de participar integralmente dos períodos dedicados ao planejamento, avaliação e ao desenvolvimento profissional”.

Fora do ordenamento jurídico, especialmente o do parâmetro estabelecido pela LDBEN, qualquer instituição de ensino, pública ou privada, municipal ou estadual ou federal,  que negue o princípio de liberdade de ensinar do docente e a liberdade de aprender do aluno estará fora da lei, em desobediência civil.

Numa exegese simples, significa que os docentes devem ministrar  os dias letivos, dentro ou fora do estabelecimento de ensino,  com ou sem a presença dos alunos, como no caso do tempo de preparação para suas atividades didáticas em sala de aula. De outro modo, aos docentes deve ser assegurada a tarefa de ministrar horas-aula, dentro ou fora também dos estabelecimentos de ensino, sendo que, neste caso, unicamente nesta situação, com a presença obrigatória dos alunos.

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