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Uma breve história da infância

 

UMA BREVE HISTÓRIA DA INFÂNCIA

 

Simone Alves Scaramuzza*

 

Simone Alves Scaramuzza É Graduada em Pedagogia pela Fundação Universidade Federal de Rondônia, Campus de Ji-Paraná, e-mail: simonescaramuzza23@gmail.com

Resumo: este texto tem por objetivo fazer uma análise do processo histórico da concepção de criança e de infância. Realiza-se uma reflexão sobre como essa temática tem sido tratada pelas legislações. Em termos metodológicos, as reflexões aqui elencadas são sustentadas pela pesquisa bibliográfica. A partir do estudo, compreende-se que a criança foi vista historicamente como um ser em miniatura, foi somente no século XX que a criança começou a ser observada como produtora de cultura, sendo objeto de preocupações de políticas públicas e legislações específicas.

Palavras-chave: Criança, Infância, Legislações Educacionais, Formação de Professores, Inclusão.

 

A infância em uma breve história

 

Nem sempre se teve presente na história da humanidade a concepção de criança. Muller e Redin (2007) inspiradas em Ariès mostram quando começa o surgimento da concepção social de criança para tratar dos pequenos indivíduos invisíveis da sociedade. Segundo Ariès (apud MULLER; REDIN, 2007), a criança teve visibilidade somente no período da modernidade. Diante de tais fatos, é possível evidenciar que, até este período, as crianças eram invisíveis socialmente, pois, ou eram seres meramente biológicos, ou eram adultos em miniatura, ou seja, não tinham qualquer “[…] estatuto social nem identidade específica” (p.11). A esse respeito, Silva, Raitz e Ferreira (2009) apontam com base no estudo de Ariès, que na sociedade medieval existia uma separação/ruptura entre o mundo dos pequenos e o mundo dos adultos.

Durante o período medieval, os pequenos eram socialmente invisíveis até a idade em que poderiam ser considerados aptos para representar-se socialmente, e assim, passar a se caracterizar e comportar da mesma forma que o adulto. Muller e Redin (2007) apontam então que essa ideia/concepção de criança emerge na sociedade moderna, dentro de um “berço” familiar e escolar, e que foi promovido pelo modelo mercantil do século VIII (SILVA; RAITZ; FERREIRA, 2009).

As autoras apresentam outros estudiosos (Kuhlmann; Fernandes, 2004) que contrapõe o estudo de Ariès, quando apontam que “[…] existe diferença ente as representações sobre a infância feita por Ariès e as reais condições de vida das crianças através dos tempos” (p.12). Para esses autores, existe a problemática de que os estudos efetivados sobre criança são sempre na perspectiva do adulto, e não da própria criança, ou seja, não se dá para os pequenos o direito para que eles próprios falem. Assim, os estudos efetivados sobre criança, representam a visão que o adulto têm das crianças e das situações que elas vivenciam, e não, propriamente, a visão da criança sobre tais fatos, ou seja, não se permite aos pequenos, nem voz e nem vez (KUHLMANN; FERNANDES apud MULLER; REDIN, 2007).

Atualmente, as crianças são vistas e tidas como alvos de projetos de futuro de mundo. O que isso quer dizer? Para Muller e Redin (2007) isso significa que as pessoas da modernidade/atualidade/contemporaneidade depositam sobre as crianças as expectativas sobre o futuro, ou seja, “[…] coloca na figura das crianças uma grande expectativa sobre seu futuro – o que poderia se tornar aquele pequeno homem ou aquela pequena mulher” (MULLER; REDIN, 2007, p. 13), e a isso, se vinculam os questionamentos e preocupações sobre o que vai ser dessas crianças no futuro, o que vão fazer, cria-se expectativas sobre esses pequenos.

Tais situações impelem a questionar: Mas o que é ser criança? Qual é a concepção de infância? Considerando o primeiro questionamento há certa complexidade para definir a concepção de criança. Entretanto, alguns autores tais como Silva, Raitz e Ferreira (2009), Muller e Redin (2007) têm evidenciado que criança é uma categoria social definida por um tempo de vida (idade) e características específicas. Para Silva, Raitz e Ferreira (2009) “[…] as crianças […] são atores sociais dotados de pensamento crítico e reflexivo, por isso mesmo, chama-se a atenção para suas ações como prova de si” (p. 78).

A respeito do segundo questionamento, esta indagação também é complexa para se definir. Entretanto, é possível perceber que esta vem sendo considerada como     “[…] um conjunto de características ou elementos comuns às diferentes crianças, nos diferentes tempos e espaços, tais como a ludicidade, a interatividade, a fantasia do real e a reiteração” (SARMENTO apud MULLER; REDIN, 2007, p. 14). A respeito da infância, os autores Silva, Raitz e Ferreira (2009) argumentam que no modelo social contemporâneo “parece ser consenso […]  que a infância deve ser um período de vida para viver as brincadeiras e não para ser ocupada com o trabalho” (p. 78).

Diante de tais fatos históricos, é possível perceber que nem sempre as crianças tiveram visibilidade social, ou seja, antes do período moderno, os pequenos não tinham espaço social definido, ou eram seres meramente biológicos, ou eram adultos em miniatura. A partir disso, é possível se questionar como as políticas governamentais tem dado atenção para as crianças. Como essas políticas tem garantido aos pequenos infantes, os direitos básicos, tais como, educação, saúde, segurança, moradia, alimentação, entre outros, bem como dado a elas o direito de viver esta fase tão importante da vida, ou seja, o direito de brincar.  Fundamentado em tais questionamentos, é que se esboça o próximo tópico deste texto.

A questão das legislações voltadas para a educação infantil

O advento das mudanças no tratamento da criança e da educação é visível nas últimas décadas. A temática das políticas públicas voltada para o atendimento da infância é reflexo de lutas e pressões sociais, bem como, consequência das amplas pesquisas que vêm sendo desenvolvidas e, que têm como eixo central, a criança.

Seguindo uma ordem cronológica, é a partir da constituição federal de 1988, que a criança começa a ser vista como cidadã. Assim, após a maior legislação brasileira – Constituição federal de 1988 –, o primeiro documento legal promulgado que garante os direitos das crianças e adolescentes foi o Estatuto da Criança e do Adolescente – Lei n. 8.069 de 13 de julho de 1990, que estabelece para as crianças e adolescentes, os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, bem como, os direitos à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, entre outros.

Com referência específica a educação, o documento legal que regula o sistema educacional, é a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional 9394/96 que com sua promulgação, regulamenta a oferta da educação infantil, mas não a torna obrigatória. Esta lei sofreu várias alterações desde a sua promulgação. Uma delas foi por conta da Lei nº 11.114 de maio de 2005 que tornou obrigatória a matrícula a partir dos 6 anos de idade, ampliando assim, de oito para noves anos o ensino fundamental. Tal ampliação tem sido apontada como sendo um pequeno avanço no atendimento educacional para crianças, por antecipar de 7 para 6 anos a obrigatoriedade da matrícula no ensino fundamental.

Outra alteração importante foi feita pela Lei nº 12.796 de 4 de abril de 2013, que torna obrigatória a matrícula de crianças de 4 e 5 anos de idade na educação infantil pré-escolar, e ainda amplia esta obrigação da matricula dos 14 para 17 anos de idade.

A respeito das legislações, Oliveira (2008) expõe que estas leis têm contribuições que estão sendo incorporadas a atual política nacional para a oferta da educação infantil. Nesse sentido, a autora sintetiza as principais contribuições dessas legislações, sendo elas,

a criança é o sujeito de direitos e sua educação deve ser assegurada a partir do seu nascimento, cabendo ao Estado fazê-lo, em complementação à ação da família; a relação entre a União, estados, Distrito Federal e municípios realiza-se a partir da instituição de um regime de colaboração mútua; os municípios têm a responsabilidade pela oferta da educação infantil; a educação infantil é considerada a primeira etapa da educação básica e tem como finalidade o desenvolvimento integral da criança até 6 anos de idade, em seus aspectos físicos, psicológico, intelectual e social; a habilitação exigida para trabalhar com a crianças de 0 a 6 anos é em nível superior, aceitando-se que seja, no mínimo, em nível médio; a formação continuada dos profissionais de educação deve ser assegurada pelos sistemas de ensino, em uma constante associação entre teoria e prática. (OLIVEIRA, 2008, p.36).

De acordo com o que propõe a autora, verifica-se que as legislações trouxeram contribuições relevantes para a garantia de direitos da criança e para o oferecimento da educação infantil. Entretanto, ainda se identifica que muitas dessas contribuições ainda estão longe de se concretizarem, pois ainda estão no plano ideal, ou seja, ainda representam-se como desafios para a implantação de uma educação infantil de qualidade. Outras questões também contribuem para tornar complexa ainda mais a educação infantil, tais como, a temática da inclusão de crianças deficientes nessa modalidade de ensino, e a formação de professores, tema para uma outra discussão.

Referências

 

BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – Lei N. 9394 de 20 de dezembro de 1996. Disponível em: ˂http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9394.htm>.  Acesso 16/jan./2014.

______. Estatuto da Criança e do Adolescente – Lei N. 8.069, de 13 de julho de 1990. Disponível em: ˂http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm>. Acesso 09/jan./2014.

BRASIL. Ministério da Educação. Parâmetros Curriculares Nacionais: adaptações curriculares – estratégias para a educação de alunos com necessidades educacionais especiais. Secretaria da Educação Fundamental / Secretaria da Educação Especial. Brasília: MEC/SEF/SEESP, 1999.

MULLER, Fernanda; REDIN, Marita Martins. Sobre as crianças, a infância e as práticas escolares. In: REDIN, E. et al. (Org.) Infâncias: cidades e escolas amigas das crianças. Porto Alegre: Mediação, 2007. p.11-22.

OLIVEIRA, Stela Maris Lagos. A legislação e as políticas nacionais para a educação infantil: avanços, vazios e desvios. In: MACHADO, M.L. de A. (Org.). Encontros e Desencontros em Educação Infantil. 3. ed. São Paulo: Cortez, 2008. p. 35-42.

SILVA, Cleber Fabiano da; RAITZ, Tânia Regina; FERREIRA, Valéria Silva. Desafios da Sociologia da Infância: uma área emergente. Psicologia e Sociedade. [online]. v.21, n.1, p. 15-80, 2009. Disponível em: ˂ http://www.scielo.br/pdf/psoc/v21n1/09.pdf˃. Acesso em: 05 de set. de 2013.

 

* Graduada em Pedagogia pela Universidade Federal de Rondônia, Campus de Ji-Paraná. Mestre em Educação no Programa de Pós-Graduação em Educação – Mestrado e Doutorado, da Universidade Católica Dom Bosco. e-mail: simonescaramuzza23@gmail.com

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