Educação Educação educação infantil

Tecendo redes de leitura: dos professores leitores aos alunos leitores

Jozaene Maximiano Figueira Alves Faria[1]

Jozaene Maximiano Figueira Alves Faria -Especialista em Psicopedagogia Escolar. Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Educação/PPGED/UFU. Professora da Educação Infantil na rede Municipal de Ensino de Uberlândia, ORCID: https://orcid.org/0000-0003-0499-8472 e e-mail: josy2209@yahoo.com.br.

RESUMO: O presente artigo tem por objetivo apresentar as contribuições do Pacto Nacional para a Alfabetização na Idade Certa (PNAIC)[2] na formação de professores leitores. Uma das propostas desse programa foi o compartilhamento de leituras de livros literários entre os participantes. O texto fundamenta-se nas concepções sobre linguagem de Bakhtin/Volochínov (2009); Rego (1995); Freire (2008) e da modernidade líquida de Bauman (2001).

PALAVRAS-CHAVE: Educação Infantil. Leitura. Professores leitores. Literatura.

ABSTRACT: This article aims to present the contributions of the Pacto Nacional para a Alfabetização na Idade Certa (PNAIC) in the formation of reading teachers. One of the proposals of this program was to share reading of literary books among the participants. The text is based on Bakhtin / Volochínov’s (2009); Rego (1995); Freire (2008) about conceptions of language and liquid modernity with Bauman (2001).

KEYWORDS: Child education. Reading. Reading teachers. Literature.

Introdução

         A preocupação com apropriação da língua escrita dos alunos desencadeou a criação de alguns programas de formação continuada de professores, como o Pacto Nacional para Alfabetização na Idade Certa (PNAIC). Programa criado em 2012, com finalidade de alfabetizar crianças até o final do 3º ano do ensino fundamental, seguindo a meta apresentada pelo Plano Nacional de Educação (PNE), envolvendo as esferas públicas federal, estadual e municipal. No ano de 2017 o PNAIC envolveu também a educação infantil. (BRASIL, 2012)

         Tendo como referência o projeto “Tertúlia Literária: quem lê também tem muito a dizer” (BELMIRO; MACHADO; BAPTISTA; 2015) desenvolvido pelo Grupo de Pesquisa e Estudos sobre o Letramento Literário (GPELL), do Centro de Alfabetização, Leitura e Escrita (CEALE) da Faculdade de Educação (FaE) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). O PNAIC 2017/2018 propôs em seus encontros presenciais, que alguns docentes apresentassem sua experiência mediante a leitura prévia de um livro para os demais participantes, estimulando assim o hábito da leitura. Por meio desses encontros, observamos a riqueza dessa experiência, pois os professores começaram a trocar os livros entre si, levaram a Tertúlia Literária para suas escolas e dessa forma, a rede de professores leitores começou a ser tecida.

Fundamentação Teórica

          O ato de ler é complexo, pois por meio dele há interação consigo mesmo, com o outro e com o conhecimento, desse modo “a leitura é uma habilidade indispensável à vida social. É através dela que entendemos o mundo e interagimos com o outro, seja nos estudos, na nossa comunicação, na forma de nos expressarmos, nos conhecimentos que ela nos proporciona.” (CAVALCANTE FILHO, 2011, p. 1721)

         Sendo assim, o ato de ler não pode ser considerado como algo mecânico, mas sim provido de significados dados pelas vivências e experiências do leitor a partir de suas interações sociais.  Assim, de acordo com Bakhtin/Volochínov (2009, p.127), “A interação verbal constitui assim a realidade fundamental da língua.”. Ao compreender que a constituição do sujeito se dá por meio das interações sociais, podemos citar a teoria histórico-cultural de Vygostky. Nessa perspectiva, “o desenvolvimento humano é compreendido […] através de trocas recíprocas, que se estabelecem durante toda a vida, entre indivíduo e meio, cada aspecto influindo sobre o outro.” (REGO, 1995, p.95)

         De acordo com o sociólogo e filósofo polonês Zygmunt Bauman, em sua teoria “Modernidade líquida” (2001), realizada através da sociedade contemporânea, as ações realizadas por um indivíduo tendem a influenciar as ações de outro indivíduo ou de um grupo ao seu redor. Desta maneira, a formação de professores críticos e leitores, tende a criar uma comunidade escolar que seja seu reflexo.

        Ainda sobre importância da leitura na formação humana, destacamos Paulo Freire, acreditava em uma educação libertadora, na qual defende que o sujeito aprende a partir de suas vivências, pelo que faz sentido e tem significado para ele. Sendo que o conhecimento de mundo estabelece uma relação dialética com o processo que aquisição da linguagem; nesse sentido “a leitura de mundo precede a leitura da palavra, daí que a posterior leitura desta não possa prescindir da continuidade da leitura daquele. Linguagem e realidade se prendem dinamicamente.” (FREIRE, 2008, p. 11).

           Diante dessa complexidade do ato de ler, precisamos discutir a importância do hábito de leitura na formação docente e na prática pedagógica. Assim propomos a reflexão de quanto tempo os professores, destinam a leitura de livros literários no cotidiano e de como formar leitores se não experimentam o hábito e prazer pela leitura.

          Nesse sentido, a pesquisa de Barros e Gomes (2008, p.339), destaca que a maioria dos educadores possui uma relação pouco favorável com a leitura. Essa postura influencia diretamente nas práticas de leitura e escrita na sala da aula. “Ao desejar formar bons leitores é necessário gostar de ler e realizar leituras prazerosas. Tais dados mostram que, é fundamental que os professores e demais mediadores de leitura modifiquem a sua postura em relação à leitura.”

         A proposta de se construir uma rede de professores leitores enseja estimular o hábito de ler tanto de docente quanto dos discentes. Desse modo, os educadores podem influenciar na formação crítica dos seus alunos e consequentemente de uma sociedade mais justa. Assim, “os cidadãos e cidadãs socialmente comprometidos deveriam ser capazes de tirar partido das possibilidades que a rede oferece, para sensibilizar e engajar o resto da cidadania em torno de causas humanitárias, sociais ou culturais.” (PRATS, 2014. p. 276)

         Ao abordamos a palavra rede, nos remete a pontos que se interligam formando um grande tecido, tal descrição se aplica a educação quando consideramos as redes de aprendizagem como uma possibilidade de construção de conhecimento, a partir da interação entre os sujeitos, por intermédio de diversos instrumentos educacionais e tecnológicos. Portanto, “Sua utilização correta leva os indivíduos a se relacionarem e colaborarem com o processo de criação do conhecimento, o que contribui a dar-lhes ferramentas para uma leitura crítica da realidade.” (DRUETTA, 2014, p. 137)

         Portanto, é preciso estimular o hábito de leitura entre os professores, para que eles incentivem seus alunos a serem leitores também e assim tecer uma rede de educadores leitores que se entrelacem aos educandos leitores.

 

Considerações finais

            O PNAIC, na educação infantil, proporcionou a formação continuada de professores da rede pública no Brasil. E uma das propostas, dentro desse programa, que contribuiu para o estímulo da leitura foi a “Tertúlia Literária”, haja vista que, muitos educadores não tinham o hábito de ler livros literários. E a partir dos relatos dos próprios participantes do curso, esse momento de compartilhamento de leituras foi levado para as escolas, para as crianças.

         É necessário destacar que o Pacto apresentou algumas limitações, dentre eles: falta de disponibilização dos cadernos impressos; não houve bolsa para os participantes, como em anos anteriores; o material era muito extenso para ser trabalhado em apenas cinco encontros; mesmo utilizando autores reconhecidos, alguns conceitos importantes não foram aprofundados. No entanto, foi uma iniciativa que contribuiu para a formação de professores da rede pública, especialmente na educação infantil.

         Apesar de não ser um preocupação do atual governo de nosso país, programas como esse precisam ser retomados, mesmo que precisem de reformulações, mas que prevaleça a autonomia do professor e que seus alunos sejam cidadãos capazes de intervir de maneira justa na sociedade.

 

REFERÊNCIAS

Livros

BAKHTIN, M. M./ VOLOCHINOV, V. N. Marxismo e filosofia da linguagem: problemas fundamentais do método sociológico da linguagem. Tradução de Michel Lahud e Yara Frateschi Vieira. 13.ed. – São Paulo: Hucitec, 2009.

BARROS, A. J. S. e LEHFELD, N. A. S. Fundamentos de Metodologia: Um Guia para a Iniciação Científica. 2 Ed. São Paulo: Makron Books, 2000.

BAUMAN, Zygmunt. Modernidade líquida. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2001.

DRUETTA, Della Crovi. A trama reticular da educação: uma perspectiva desde a comunicação. In: APARICI, Roberto (Org.). Educomunicação: para além do 2.0. São Paulo: Paulinas, 2014. p. 121 – 143.

FREIRE, Paulo. A importância do ato de ler. 48 ed. São Paulo: Cortez, 2008.

REGO, Teresa Cristina. Vygotsky: uma perspectiva histórico-cultural da educação. Petrópolis, RJ: Vozes, 1995.

Publicação On-line – Internet

BARROS, Tristana Nascimento; GOMES, Erissandra. O perfil dos professores leitores nas séries iniciais e prática de leitura em sala de aula. Rev CEFAC, São Paulo, v.10, n.3, 332-342, jul-set, 2008. Disponível em < http://www.scielo.br/pdf/rcefac/v10n3/v10n3a08> Acesso em 29 out 2018.

BELMIRO, C. A.; MACHADO, M. Z. V.; BAPTISTA, M. C. Tertúlia literária: construindo caminhos para a formação literária de professores alfabetizadores na universidade. Perspectiva, Florianópolis, v. 33, n. 1, 97- 117, jan./abr. 2015. Disponível em < https://periodicos.ufsc.br/index.php/perspectiva/article/view/2175-795X.2014v33n1p97>. Acesso em 29 out. 2018.

BRASIL. Portaria nº 867 de 4 de julho de 2012. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_docman&view=download&alias=11125-05072012-portaria-867&category_slug=junho-2012-pdf&Itemid=30192>. Acesso em 5 nov. 2018.

CAVALCANTE FILHO, Urbano. Estratégias de leitura, análise e interpretação de textos na universidade: da decodificação à leitura crítica. Cadernos do CNLF, Vol. XV, Nº 5, t. 2. Rio de Janeiro: CiFEFiL, 2011. Disponível em <http://www.filologia.org.br/xv_cnlf/tomo_2/144.pdf>. Acesso em 25 out. 2018.

[1]Especialista em Psicopedagogia Escolar. Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Educação/PPGED/UFU. Professora da Educação Infantil na rede Municipal de Ensino de Uberlândia, ORCID: https://orcid.org/0000-0003-0499-8472 e e-mail: josy2209@yahoo.com.br.

[2] A autora desse artigo atuou como formadora local do PNAIC, educação infantil, nos anos de 2017 e 2018, na cidade de Uberlândia-MG.

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