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Estado de Bem-Estar Social e Estado Neoliberal – rupturas ou continuidades?

SOUZA, Raquel Aparecida[1]

 

 Resumo: O texto discute sobre os modelos de Estado de Bem Estar Social e Estado Neoliberal. Objetiva socializar uma síntese reflexiva e de caráter didática a respeito de alguns elementos que possibilitam a compreensão acerca das características, gênese e desenvolvimento desses dois modelos de Estados. Utilizou-se uma pesquisa bibliográfica buscando abordar os principais elementos desses modelos de Estado. Como resultados percebe-se que, considerando o momento atual vivenciado pela nova ordem mundial por meio do poderio econômico das grandes nações e interesses privados, o poder e a representatividade dos Estados têm sido questionados e por sua vez, esses modelos também. 

Palavras-Chave: Bem-Estar Social. Estado Neoliberal. Intervencionismo. Acumulação Flexível

 

Abstract: Abstract: The paper discusses about the models of Welfare State and Neoliberal State. It aims to socialize a reflexive and didactic synthesis about some elements that make possible the understanding about the characteristics, genesis and development of these two models of States. A bibliographical research was used to approach the main elements of these state models. As a result, one can perceive that, considering the current moment experienced by the new world order through the economic power of the great nations and private interests, the power and the representativeness of the States have been questioned and your time, these models also. 

Keywords: Wealfare State. Neoliberal State. Interventionism. Flexible Accumulation.

 

 

Considerações iniciais

Neste estudo não tivemos a intenção de fazer um resgate histórico e detalhado acerca das teorias e origens dos modelos de Estado, nem mesmo de apresentar seu percurso de constituição e formação de forma pormenorizada. Interessou-nos compreender, a partir de uma revisão bibliográfica, alguns elementos que se mostram importantes nesse processo por serem marcados por múltiplas determinações.

Nesse sentido, o objetivo do texto é apresentar uma síntese de caráter didática sobre alguns elementos que possibilitam a compreensão sobre a relação das características, gênese e desenvolvimento desses dos modelos de Estado de Bem Estar Social e do Estado Neoliberal.

É notável como a instituição “Estado” vem passando por profundas transformações, pois acompanha as mudanças que ocorrem nas formas de produção no âmbito mundial, sobretudo quando nos deparamos com as situações das consequências de guerras, de crises e imposições de novas formas de organização social e global, o que tem gerado muitas discussões sobre o real papel do Estado.

No momento atual, vivenciado pela nova ordem mundial por meio do poderio econômico das grandes nações e interesses privados, vemos que o poder e a representatividade dos Estados têm sido questionados e por sua vez, esses modelos também.

O Estado de Bem Estar Social, Estado Providência ou Wealfare State

No século XX, a partir dos anos de 1930, entra em vigor um novo modelo econômico conhecido por Estado de Bem-Estar Social ou Estado Interventor. Após a Primeira Guerra Mundial (1918), e a Crise Econômica de 1929, o capital entra em crise e um novo modelo é demandando para manter o capital vivo. Assim de forma contraditória, mas apresentando-se como uma alternativa, o novo modelo de Estado Interventor tem como características a promoção e a defesa aos direitos sociais.

Esse modelo de Estado intervencionista, conhecido por Estado de Bem-Estar Social, Estado-Providência ou Welfare State, representa um sistema político e econômico com base na livre empresa, mas com a presença do Estado nos assuntos sociais. Esse tipo de Estado surge como uma forma de reverter problemas advindos do liberalismo e do absolutismo, considerando o processo de industrialização dos países europeus e a necessidade de criação de políticas sociais, e como destaca Draibe (1993), representando uma forma de garantir direitos e a proteção dos serviços públicos, os quais deveriam ser regulamentados pelo Estado para garantia de bem-estar a todos.

Groppo (2005) lembra que esse é um dos tipos históricos do Estado Moderno e ele foi um Estado Interventor considerando que, “parecia conformar um todo coerente e duradouro, cujos direitos sociais propalados aparentemente tinham eterna vigência garantida, incluindo uma educação pública gratuita, de qualidade e inclusiva”, (p.2), no entanto, não foi isso que ocorreu no seu processo de desenvolvimento.

“Interventor” e “Provedor”, na medida em que representa um modelo de Estado adotado na Europa Ocidental no qual visava criar políticas com a intenção de garantir qualidade de vida para todos os cidadãos numa perspectiva mais assistencialista evitando, assim, problemas de ordem social.

Ao discutir as origens e decadências do Estado de Bem-Estar Social, Groppo (2005) o faz a partir da integração desse tipo de Estado com o capitalismo, tendo em vista que após as guerras mundiais, esse modelo se apresenta como um instrumento de auxílio aos problemas sociais e econômicos em âmbito mais funcionalista como ressalta o autor, já que, pelo menos por um período, houve crescimento econômico mundial.

[…] a busca de um modelo que suavizasse os conflitos de classe, a busca de uma rotina que aliasse crescimento econômico com distribuição de renda (impedindo a temida “Revolução”), a construção de instituições que resolveriam – no âmbito estatal – as querelas advindas dos diferentes interesses de classe e de frações de classe. A aceleração da internacionalização e, enfim, da globalização da economia, num primeiro momento constrói a possibilidade do Estado de Bem-Estar – durante o período de enorme crescimento econômico no Pós-2ª Guerra Mundial. (GROPPO, 2005, p.2).

Nesse modelo de Estado, predominou a organização da administração produtiva conhecida como Fordismo que, segundo Antunes (2003), baseava-se na produção em massa de mercadorias, sendo que a atividade de trabalho se reduzia a atividades mecânicas e repetitivas realizadas por operários semiqualificados.

Considerando a esfera econômica, Silva Junior e Sguissardi (2001) argumentam que se trata de um modelo que tem a “base produtiva com tecnologia rígida, produtos homogêneos e produção em larga escala”, (p.104), e lembram, ainda, que ao se tratar de produção em massa, há também grande apelo para o consumo em massa.

É entendido como Estado Regulador, como apontam esses autores, pois, na esfera política e econômica, o Estado de Bem-Estar Social, precisava manter um compromisso com as classes criando políticas de distribuição de renda e para haver equilíbrio nesse modelo, essas políticas e legislações sociais precisavam ser regulados por meio de impostos e fundos públicos, geridos pelo Estado, o que representava para os autores um fetichismo do Estado capitalista.

O Estado de Bem-Estar Social, portanto, participa da reprodução do capital e da força de trabalho, ocupando, dessa maneira, um lugar central na dinâmica do Fordismo. Na medida em que participa da reprodução do capital e do trabalho, promovendo o compromisso, o Estado de Bem Estar Social desenvolve, ao mesmo tempo, uma intensa politização das relações entre capital e trabalho no interior do próprio Estado – oferecendo, desta forma, um certo grau de transparência do fetichismo do Estado Capitalista, que se apresenta como representante de toda nação, quando, ainda que com um certo grau de autonomia, representa e unifica os vários setores sociais ligados ao capital. (SILVA JÚNIOR, SGUISSARDI, 2001, p.105).

A gestão do fundo público pelo Estado tinha que levar em consideração as negociações políticas internas entre representantes do capital e do trabalho, o que segundo Silva Júnior e Sguissardi (2001), mostra como as instituições políticas e sociais tinham presença e como eram complexas as relações entre Estado e Sociedade, considerando a organização interna do fordismo que era rígida.

Para Antunes (2003), esse sistema de compromisso e regulação no Estado de Bem-Estar Social ficava limitado a uma parcela de países capitalistas avançados e, portanto, na verdade se oferecia uma ilusão de que “o sistema de metabolismo social do capital pudesse ser efetivo, duradouro e definitivamente controlado, regulado e fundado num compromisso entre capital e trabalho mediado pelo Estado” (p.38). (grifos do autor). Enquanto aos países subdesenvolvidos, que eram excluídos dos compromissos, restava a exploração do trabalho.

Ao mesmo tempo em que o Estado precisava criar mecanismos de regulação para equilibrar o sistema de produção e consumo, garantir a elevação das taxas de lucros nas empresas, precisava gerir os organismos políticos e ações de operários que se organizavam em sindicatos em busca de que seus direitos sociais fossem garantidos, como aponta Antunes (2003), “O compromisso fordista deu origem progressivamente à subordinação dos organismos institucionalizados, sindicatos e políticos, […] convertendo esses organismos em verdadeiros cogestores do processo global de reprodução do capital”. (p.39).

Como estratégia para resolução desses e outros dilemas, Antunes (2003) ressalta que o Estado, na sua concepção de “Estado Providência”, aproveita-se da situação de representante e gestor geral dos movimentos operários e organismos políticos, propagando-se por uma concepção estadista por meio de um ideário de “poder coletivo, arbitral e de exterioridade frente ao capital e ao trabalho”. (p.39), o que levou ainda mais a uma dependência ao Estado de Bem-Estar Social.

Esse processo significou, para segmentos importantes do proletariado europeu “um acréscimo da dependência tanto prática quanto ideológica, em relação ao Estado, sob a forma do famoso ‘Estado-providência’. Dentro da moldura do fordismo, com efeito, esse Estado representa, para o proletariado, a garantia de ‘seguridade social’, com sua qualidade de gestor geral da relação salarial: é o Estado que fixa o estatuto mínimo dos assalariados […]; é ele que impulsiona a conclusão e garante o respeito das convenções coletivas; é ele que gera direta ou indiretamente o ‘salário indireto’”. (ANTUNES, 2003, p.40).

Essas estratégias estatais são explicadas, como destaca Groppo (2005), por um dos maiores representantes do Estado de Bem-Estar Social que é Keynes, segundo o qual, a partir de suas preocupações com relação aos efeitos sociais negativos na economia, vai defender que a presença e interferência do Estado eram necessárias para garantir o emprego, o equilíbrio nas taxas de lucros, a criação de estatais e iniciativas de obras públicas garantindo a oferta de trabalho, além de que também poderia “impedir a convulsão do sistema pelas lutas de classe e pela revolução”. (p.4).

No entanto, sinais de crises desse Estado começaram a surgir. A partir dos anos 1960 e 1970, como destaca Antunes (2003), a própria base de sustentação na produção por meio do profissional semiqualificado, capaz de cumprir ordens e fazer a mesma atividade por um longo período de tempo, já não se sustentava mais considerando as necessidades do capitalismo, as novas demandas de produção e as constantes ações e lutas de trabalhadores em busca de novas condições de trabalho.

Se o operário-massa foi a base social para a expansão do ‘compromisso’ social-democrático anterior, ele foi também seu principal elemento de transbordamento, ruptura e confrontação, da qual foram forte expressão os movimentos pelo controle social da produção. (p.41).

Outros sinais da crise ainda são destacados também por Antunes (2003), considerando que, após um longo período de acumulação de capitais, há uma queda da taxa de lucro causada pelo aumento do valor da mão de obra associado às constantes lutas sociais, levando a uma “redução dos níveis de produtividade do capital, acentuando a tendência decrescente da taxa de lucro”; Ocorre também um “esgotamento do padrão de acumulação taylorista/fordista de produção; Uma “hipertrofia da esfera financeira”, que ganhava autonomia com relação aos capitais produtivos; Uma “maior concentração de capitais” a partir de fusões entre empresas; Destaca-se a também a crise fiscal e somado a isso, o processo crescente de privatizações”. (p.29-30).

Filgueiras (1997) ressalta que o fordismo não se caracterizou apenas como um modelo de organização do processo de trabalho, mas também como um “novo modo de vida”, que vai além dos limites das fábricas e que levou à “construção de um novo homem”, o qual devia se adaptar às demandas exigidas pela dinâmica de produção e, nesse sentido, a crise do fordismo levou também à crise de certo “modo de vida”.

O autor ainda acrescenta que “A quebra de um pacto social, caracterizado pela busca do ‘pleno emprego’, por certa estabilidade no trabalho e por amplas garantias sociais. É justamente a destruição desse ‘modo seguro de viver’ […] que dá origem à profunda instabilidade e insegurança específicas”. (p.904-905). Esses também são fatores muito relevantes e se somam aos motivos que levaram à crise do modelo de Estado de Bem Estar Social.

Estado Neoliberal

Como estratégias para saída da crise fordista têm-se o processo de reorganização do capital e do trabalho, a privatização do Estado e o neoliberalismo, como pontua Antunes (2003):

[…] iniciou-se um processo de reorganização do capital e do seu sistema ideológico e político de dominação, cujos contornos mais evidentes foram o advento do neoliberalismo, com a privatização do Estado, a desregulamentação dos direitos do trabalho e a desmontagem do setor produtivo estatal, da qual a era Thatcher-Reagan foi a expressão mais forte; a isso se seguiu também um intenso processo de reestruturação da produção e do trabalho, com vistas a dotar o capital do instrumental necessário para tentar repor patamares de expansão anteriores. (p.31). (grifos do autor).

As propostas de reorganização do capital e do trabalho foram feitas a partir do processo de “acumulação flexível”, ao lado de um modelo neoliberal de Estado. Esse modelo surge com ideais contrárias ao do Estado de Bem-Estar Social, o qual para essa nova visão, representou a raiz dos problemas econômicos no período pós-guerra segundo Friedrich Hayek, um dos principais defensores desse modelo.

Os escritos desse autor datam de 1944, mas inicialmente eles não foram levados a sério e somente depois com as consequências das crises impostas à sociedade capitalista, seu livro “Caminhos da Servidão” tornou-se “um verdadeiro manifesto político da direita”, como destaca Silva Júnior. (2002, p. 31).

Nessa obra, “O Caminho da Servidão”, Hayek (2010) demonstra que os modelos de Estados anteriores não deram conta de resolver os problemas vivenciados pelas sociedades de cada época. Sobre o modelo liberal, por exemplo, ele afirma que o sucesso desse modelo foi a causa do seu próprio declínio.

O liberalismo veio a ser considerado uma filosofia “negativa” porque não podia oferecer a cada indivíduo mais do que uma participação no progresso comum – progresso cada vez mais considerado natural e inevitável e não mais encarado como decorrente da política de liberdade. Pode-se mesmo dizer que o próprio sucesso do liberalismo tornou-se a causa do seu declínio. Devido ao êxito já alcançado, o homem se foi mostrando cada vez menos disposto a tolerar os males ainda existentes, que a essa altura lhe pareciam insuportáveis e desnecessários. (HAYEK, 2010, p. 43-44).

Faz críticas ao Estado de Bem-Estar Social e à sua concepção de construir “objetivos sociais” e “propósitos comuns” de organização da sociedade a partir de um “bem-comum”, entendendo que é difícil mensurar esse bem a todos de uma mesma forma, pois “O bem-estar e a felicidade de milhões não podem ser aferidos numa escala única de valores. O bem-estar de um povo, assim como a felicidade de um homem, depende de inúmeras coisas que lhe podem ser proporcionadas numa infinita variedade de combinações”. (HAYEK, 2010, p. 76).

Hayek defende então que o Estado Neoliberal se apresenta como uma solução contrária ao modelo de Estado de Bem-Estar social, sendo que o papel de interventor máximo passa a ser o de um Estado mínimo, ou seja, não interventor. Defende a tese do individualismo e o respeito à liberdade individual, da qual faz parte a propriedade privada, por isso o mercado deve ser autônomo e representar a livre vontade dos indivíduos.

O Estado deve limitar-se a estabelecer normas aplicáveis a situações gerais deixando os indivíduos livres em tudo que depende das circunstâncias de tempo e lugar, porque só os indivíduos poderão conhecer plenamente as circunstâncias relativas a cada caso e a elas adaptar suas ações. Para que o indivíduo possa empregar com eficácia seus conhecimentos na elaboração de planos, deve estar em condições de prever as ações do estado que podem afetar esses planos […] se o estado dirigisse as ações individuais visando a atingir objetivos específicos, teria de agir com base em todas as circunstâncias do momento, e, portanto, suas ações seriam imprevisíveis. Daí o conhecido fato de que, quanto mais o estado “planeja”, mais difícil se torna para o indivíduo traçar seus próprios planos. (HAYEK, 2010, p.91-92).

Dessa forma, o neoliberalismo foi se constituindo como um terreno fértil, fortalecendo-se como a possibilidade de resolução de problemas. Na Inglaterra, um importante marco desse modelo ocorre a partir do governo de Margareth Thatcher (1979-1990) e espalha-se em outros países significando uma forma hegemônica de pensar e viver e como um guia teórico aos partidos políticos e aos governos. (FILGUEIRAS, 1997).

Se o modelo de Estado anterior entra em crise por conta de sua rigidez interna de sua organização, com o neoliberalismo e as propostas de flexibilização, busca-se reestruturar o modo de produção e de consumo a partir da “acumulação flexível”, termo utilizado por David Harvey para representar o confronto direto com a rigidez característica do modelo fordista, visando mostrar as possibilidades de flexibilidade dos processos de mercados de trabalho, de produtos e dos padrões de consumo.

Dentre as características da acumulação flexível, destacam-se o surgimento de novos setores de produção, novas maneiras de fornecimento dos serviços financeiros, novos mercados e a intensificação das taxas de inovação tecnológica e organizacional.

Esse modelo de acumulação representa, na visão de Harvey, uma saída à crise tendo em vista que ele envolve “rápidas mudanças dos padrões do desenvolvimento desigual, tanto entre setores como entre regiões geográficas, criando, por exemplo, um vasto movimento no emprego chamado de ‘setor de serviços’”. (HARVEY, 2000, p.140).

No entanto, Antunes (2003) vai mostrar que esse sistema é contraditório e fica mais no plano do discurso, pois ao mesmo tempo em que propõem uma estrutura mais flexível por meio de “novas técnicas de gestão da força de trabalho”, do trabalho em equipe, das “células de produção”, dos “times de trabalho”, dos grupos “semiautônomos”, entre outras questões, ele continuou, assim como no modelo fordista, a exercer o controle sobre o processo de organização e exploração da força de trabalho. (p.52).

Essa nova perspectiva de produção e organização do trabalho baseia-se na desregulamentação, na flexibilidade e na privatização das necessidades coletivas. Dessa forma, a ideologia do modelo anterior de consumo de bens duráveis muda para a ideologia do consumo individualizado e exacerbado como argumenta Antunes (2003),

Opondo-se ao contrapoder que emergia das lutas societais, o capital iniciou um processo de reorganização das suas formas de dominação societal, não só procurando reorganizar em termos capitalistas o processo produtivo, mas procurando gestar um projeto de recuperação da hegemonia nas mais diversas esferas da sociabilidade. Fez isso, por exemplo, no plano ideológico, por meio do culto ao subjetivismo e de um ideário fragmentador, que faz apologia ao individualismo exacerbado contra as formas de solidariedade e de atuação coletiva e social. (p.48). (grifo do autor).

No âmbito político, o neoliberalismo defende a democracia representativa, o Estado de Direito e os direitos individuais, no entanto, não tem a intenção de dar abertura para movimentos sociais ou sindicais, tampouco se mostra preocupado com a execução de políticas sociais que “procurem diminuir as desigualdades entre indivíduos, pois isso acomoda seus beneficiários e arrefece a competição, motor maior da sociedade e da liberdade”. (FILGUEIRAS, 1997. p.900).

Consumo, concorrência, individualismo, privatização, não intervenção seja do Estado, seja dos sindicados e movimentos sociais, mercantilização, reformas, flexibilização, entre outras, passam a ser as palavras dominantes no modelo de reestruturação do novo Estado. Importante ressaltar, como pontua Filgueiras (1997), que a não intervenção do Estado está ligada às questões sociais e não no que refere à intervenção econômica e política.

Nesse contexto de reestruturação econômica, surgem como mecanismos de ajuste neoliberal para auxiliar a elaboração e execução de projetos aos países ressurgentes da crise no pós-segunda guerra mundial, os Organismos Internacionais – OIs, como o Fundo Monetário Internacional (FMI), Banco Mundial, Banco Interamericano de Desenvolvimento (BIRD), Organização Mundial do Comércio (OMC), a Organização das Nações Unidas para a educação, a ciência e a cultura (UNESCO), a Comissão Econômica para a América Latina (CEPAL).

Silva Junior e Sguissardi (2001) ressaltam que nessa nova ordem emergente, esses organismos internacionais despontam-se com um poder político e econômico para sedimentar as bases do modelo neoliberal a partir do regime de acumulação flexível. Inicialmente, foram criados com a intenção de prestar ajuda técnica e financeira, visando alcançar estabilidade econômica mundial e promover o crescimento, passando a interferir na “organização econômica e política dos Estados Nacionais, especialmente os chamados países em desenvolvimento”. (p.109). Com o passar do tempo, suas funções foram sendo ressignificadas e passaram, inclusive, a ditar as diretrizes para as reformas nos Estados.

Conclusões

Apesar da limitação com que desenvolvemos o estudo bibliográfico em torno dos modelos de Estado de Bem Estar Social e Estado Neoliberal, pois reconhecemos que um estudo mais completo merece mais aprofundamento, é possível compreendermos como em diferentes contextos históricos e políticos temos diferentes concepções de Estado.

No entanto, é perceptível como algumas marcas não têm rupturas ao longo de tantos anos da história, sobretudo as relacionadas à centralidade do poder, à busca pelo lucro, ao desenvolvimento do individualismo, às questões econômicas, entre outros.

Essas marcas são aprofundadas no Estado capitalista e por sua vez, representam muitos desafios considerando um duplo projeto de sociedade, tendo em vista a divisão das classes sociais no Brasil em que há separação entre os privilegiados e os desafortunados.

De forma geral, percebemos pelas concepções destacadas que em relação às características dos modelos de Estado, sempre esteve em jogo a questão do domínio, da riqueza, do poder, da acumulação do capital, da geração de lucros, mesmo que, por um período da história, isso tenha sido feito a partir da busca de certo “bem-estar” para todos, bem-estar que, na sua conjuntura política e econômica proposta, serviam as classes hegemônicas e donas do poder e não aos operários e trabalhadores que acumulavam as riquezas para as empresas privadas e para o Estado.

Vemos, no decorrer dessas concepções que as transformações dos tipos de Estados seguem o curso do processo de expansão do capital, cujo movimento é social, histórico e político e que se trata de um fator que independe dos preceitos e vontade dos indivíduos e que, portanto, as consequências também vão além do esforço empreendido.

Referencias

ANTUNES, Ricardo. Os Sentidos do Trabalho: ensaio sobre a afirmação e negação do trabalho. São Paulo. Boitempo Editora, 2003.

DRAIBE, Sônia. O Welfare State no Brasil: características e perspectivas. Cadernos de Pesquisa. n.8. Unicamp, São Paulo. 1993.

FILGUEIRAS, Luiz Antônio Mattos. Reestruturação Produtiva, Globalização e Neoliberalismo: capitalismo e exclusão social neste final de século. Mesa-redonda – Seminário Interdisciplinar “O Mal-Estar no Fim do Século XX”.Depto de Ciências Humanas e Filosofia da Universidade Estadual de Feira de Santana e pela Escola Brasileira de Psicanálise – Bahia/ Polo Feira.1997.

GROPPO, Antonio Luiz. Das Origens ao colapso do Estado de Bem-Estar: Uma Recapitulação Desmistificadora. Revista HISTEDBR On-line, Campinas, n.20, p. 68 – 75, dez. 2005.

HAYEK, Friedrich. O caminho da servidão.  Traduzido por Anna Maria Capovilla, José Ítalo Stelle e Liane de Morais Ribeiro. São Paulo, Instituto Ludwig von Mises Brasil. 6 ed, 2010.

HARVEY, David. Condição Pós-Moderna. São Paulo, Loyola, 2000.

SILVA JÚNIOR, João dos Reis. SGUISSARDI, Valdemar. Novas faces da educação superior no Brasil: reforma do Estado e mudanças na produção. Cortez Editora, São Paulo, 2001.

[1] Professora da UFT. Doutora em Educação pela UnB. eraquelas@gmail.com

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