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O ENSINO DE ARTES NOS PAÍSES DE LÍNGUA PORTUGUESA: ENTRE A TRADIÇÃO E A INOVAÇÃO

O ENSINO DE ARTES NOS PAÍSES DE LÍNGUA PORTUGUESA: ENTRE A TRADIÇÃO E A INOVAÇÃO

Arlete Rabelo de Oliveira*

Jefferson Rodrigues Silva*

 

RESUMO

 

Jefferson Rodrigues Silva; Professor dos cursos de Pós-graduação em Docência e Engenharia Mecânica do Instituto Federal de Minas Gerais Campus Arcos. Doutorando em Educação Matemática pela Universitat de Girona (Espanha). E-mail: jefferson.silva@ifmg.edu.br

O presente artigo analisa e discute a cooperação entre os países membros da Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP). O texto observa uma proposta de aproximação entre os países lusófonos por meio da educação artística na perspectiva da Educação STEAM (interdisciplinaridade entre as áreas Ciências, Tecnologia, Engenharia, Artes e Matemáticas). Há o desenvolvimento de um marco teórico a partir da cooperação na CPLP na área da educação, dos preceitos da metodologia STEAM e do ensino de arte em si. Tudo, sob uma perspectiva de cooperação de fato e não de transferência ou de dominação cultural. As formas de aproximar-se e relacionar-se resultam positivas como uma opção na empreitada de conhecimento, respeito e fortalecimento mútuo e contribui no desenvolvimento de pesquisas relacionadas à educação STEAM e a cooperação da lusofonia.

Palavras-chave: Ensino de arte, Lusofonia, Educação STEAM, CPLP.

ABSTRACT

This article analyses and discusses the cooperation among members of the Community of Portuguese Speaking Countries (CPLP). The text observes an approximation proposal among those countries through artistic education in the perspective of STEAM Education (interdisciplinary approach of the areas of Science, Technology, Engineering, Arts and Mathematics). There is the development of a theoretical framework based on the cooperation within the CPLP in the area of education, the precepts of the STEAM methodology and the teaching of art itself. All, from a perspective of real cooperation and not of transference or cultural domination. The ways of approaching and relating are positive as an option in the endeavor of knowledge, respect and mutual strengthening. It also contributes to the development of research related to STEAM education and the cooperation of Portuguese speaking countries.

Keywords: Art teaching, Lusophony, STEAM Education, CPLP.

 

 

1          INTRODUÇÃO

 

Arlete Rabelo de Oliveira; Discente do curso de Pós-graduação em Docência do Instituto Federal de Minas Gerais Campus Arcos. E-mail: rabelo.arlete@gmail.com

Segundo o Dicionário Online de Português o adjetivo “lusófono” é atribuído ao país, território, nação cuja língua oficial ou materna é o português (RIBEIRO, 2017). A Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) é integrada por nove membros lusófonos: Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Guiné Equatorial, Moçambique, Portugal, São Tomé e Príncipe e Timor-Leste. Além do idioma português, esses países comungam raízes culturais que se entrelaçam e estabelecem cooperações e definem metas relacionadas, entre outros aspectos, ao desenvolvimento e valorização da língua, cultura, educação e também desafios contemporâneos sociais e econômicos semelhantes (CPLP, 2020).

Embora possam existir alguns riscos em processos de cooperação, tais como a imposição de cultura e história dos países hegemônicos, para que um processo de cooperação artística possa ter sucesso, é importante um estudo elaborado sobre as culturas locais e a execução de projetos que possam favorecer a inter-relação dessas culturas dentro do ensino artístico, dialogar com as partes em posição de igualdade de troca, não deixando na transferência unidirecional.

Quando o assunto é arte, é preciso tomar alguns cuidados visto que esse campo perpassa por um contexto social mais amplo e particular. Sendo a arte uma manifestação específica de um povo, ela precisa ser estudada, respeitada, preservada e, sobretudo, incluída dentro do projeto de educação.

2          REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

 

O artigo apresenta um compilatório de casos de cooperação do Brasil com países da CPLP. Em seguida, faz-se uma reflexão sobre o que seria cooperação de fato, em que as partes se beneficiam mutuamente, ou a transferência em que há um desequilíbrio de forças e os países hegemônicos acabam tomando as decisões, suprimindo a autonomia da comunidade local.

Discorre-se sobre o ensino de artes e a sua incorporação na Educação STEAM: acrônimo que se refere à interdisciplinaridade entre as áreas Ciência, Tecnologia, Engenharia, Artes e Matemáticas. E por fim, a cooperação educacional entre os países da CPLP na área de artes e em um contexto STEAM.

 

2.1      Cooperação

 

Criada em 17 de julho de 1996, a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) tem os seguinte objetivos:

A concentração político-diplomática entre seus estados membros, nomeadamente para o reforço da sua presença no cenário internacional; A cooperação em todos os domínios, inclusive os da educação, saúde, ciência e tecnologia, defesa, agricultura, administração pública, comunicação, justiça, segurança pública, cultura, desporto e comunicação social; A materialização de projetos de promoção e difusão da língua portuguesa. (CPLP, 2020, grifo dos autores).

É preciso, porém, investigar os benefícios e malefícios das intervenções especificamente por Portugal e Brasil sobre os demais países da CPLP, cujas economias mais frágeis ou com uma população menor como Angola, Moçambique, Timor-Leste, Guiné Bissau, Cabo Verde, São Tomé e Príncipe.

Há anos o Brasil participa, segundo Milani (2016), da Cooperação Internacional para o Desenvolvimento (CID), com experiências datadas desde os anos da década de 1960. Inúmeras bolsas de estudo em graduação são concedidas devido à demanda, o que reflete a realidade do mercado local em cada país, onde os graduandos tendem a obter trabalhos mais facilmente. O Brasil coopera por via da ABC (Agência Brasileira de Cooperação) com Cabo Verde, São Tomé e Príncipe e Moçambique, com intercâmbio para graduação. Existem também projetos, além da assessoria técnica, treinamentos, parcerias em alfabetização, merenda, educação profissional.

2.2      Cooperação ou transferência?

 

Com o intuito de “cooperar” com os países de língua portuguesa, menos favorecidos, o Brasil atua em diversas áreas de desenvolvimento social. Aqui selecionado há o recorte sobre a “cooperação” na área da educação, onde a dita Cooperação Técnica engloba muitos projetos conforme foram agrupados na Tabela. 1. Nela é possível observar como a cooperação na educação se dá de forma ampla. Angola, por exemplo, é contemplada com concessão de bolsa de estudos, currículo e gestão, educação ambiental, especial, infantil, profissional e novas tecnologias, também com formação científica.

Tabela 1: Áreas de atuação da cooperação brasileira na educação de países da CPLP. Fonte: Adaptação de publicação de Silva (2012).

Mesmo que o Brasil mantenha o discurso de solidariedade para o desenvolvimento, Silva (2012) aponta alguns pontos que contradizem esse propósito, onde há uma recusa da imposição de itens como o Ensino Religioso e a Língua Portuguesa. Um exemplo é Timor Leste, que construiu um texto de lei para a educação que levava em conta princípios ocidentais como: respeito pelos direitos humanos, diversidade cultural e religiosa, a promoção de igualdade e de acesso à educação, solidariedade, social, entre outros.

2.3      Educação Artística

 

A arte, com suas múltiplas formas de expressão e linguagens perpassam pelo campo da Linguagem Visual, da Dança, da Música e do Teatro, é constituída por dimensões poéticas, cognitivas e inventivas.

O componente Arte na Base Nacional Comum Curricular (BNCC) no Brasil sugere que as linguagens artísticas se estruturem em torno de seis dimensões do conhecimento, a saber: criação, estesia, crítica, expressão, fruição e reflexão. Pensar o ensino de arte para a formação integral é pensar num indivíduo que possa apreender a realidade de forma crítica, poética e inventiva, o que vem só afirmar a importância da arte para a educação (BRASIL, 2017).

A construção se dá, principalmente, pelas relações que a arte estabelece com os outros conhecimentos, tais como a História, a Antropologia, a Ciências da Natureza, dentre outros, pois são contextos que favorecem a abertura ao diálogo entre professores e educandos e demais profissionais (BRASIL, 2001).

Os conhecimentos adquiridos com o ensino de arte são essenciais para a formação do educando em qualquer faixa etária, pois possibilita novas configurações de pensamento, ideias e emoções, o que contribui de forma significativa para a compreensão dos discursos poéticos, políticos, ideológicos, científicos e religiosos com os quais tem vivência (BRASIL, 1998).

O ensino de Arte traz uma interação crítica dos alunos com a complexidade do mundo, sobretudo favorecer o respeito às diferenças e o diálogo intercultural, pluriétnico e plurilíngue (BRASIL,1998), essenciais para a construção da cidadania, o convívio e a partilha cultural com outros países.

2.4      Raízes linguísticas e culturais

 

Faz sentido falar sobre cooperação na educação artística entre os países membros da CPLP porque eles trazem consigo um idioma comum, eles partilham uma história de colonização que se prolongou por vários séculos, e deixou marcas profundas nessas nações, tendo Portugal como país colonizador.

Muitos destes países passaram por inúmeras questões de submissão, escravidão e principalmente boicote de suas raízes linguísticas, culturais, religiosas, entre outras. Cabe ressaltar a história dos africanos e seus descentes no Brasil, que sofreram forte supressão cultural também em continente.

2.5      Educação STEAM

 

A educação STEAM, do inglês Science, Technology, Engineering, Arts and Mathematics, é considerada atualmente uma metodologia bastante recente, e ainda pouco desenvolvida no Brasil (GAROFALO, 2019).

Na aprendizagem STEAM identificam-se cinco etapas: investir, descobrir, conectar, criar, refletir. A partir daí os educandos experimentam e vivenciam o pensamento científico de uma forma mais interpretativa e reflexiva. Nesse processo, os educandos resolvem problemas interagindo com outros conteúdos, beneficiando um aprendizado interdisciplinar. O professor ensina de forma colaborativa e o trabalho é realizado de forma mais integrada (ANTUNES, 2020).

Nesse paradigma o educando desenvolve algumas habilidades essenciais para o futuro, como: criatividade, imaginação e inovação, pensamento crítico e resolução de problemas, comunicação e colaboração, flexibilidade e adaptabilidade, habilidades sociais e culturais e capacidade de lidar com diferentes soluções (GAROFALO, 2019).

3          CONCLUSÃO

 

A cooperação na área da educação entre esses países começa partindo das semelhanças, e também das diferenças entre eles, com base na arte, devendo exaltar, empoderar, ressignificar e, de certa forma, restaurar a cultura suprimida.

A educação, com suas especificidades, necessita de uma reflexão para que não haja o erro de, através dela, perpetuar a desigualdade, a alienação e injustiça social, itens já herdados do período colonial, até mesmo impedindo a necessária implementação de um novo modelo de desenvolvimento para esses povos tão explorados (SILVA, 2012).

A educação artística, de per si é um viés de desenvolvimento de respeito, compreensão e respeito entre os países. Ela pode ser aliada à implantação da Educação STEAM dentro do processo educacional na CPLP. O Brasil pode contribuir e ser beneficiado com a boa formação desses educandos e de forma horizontal, lembrando que o STEAM é igualmente uma novidade para todos os países, deixando-os em posição de maior igualdade em relação à essa metodologia.

A cooperação educacional entre países da CPLP no contexto STEAM abrange as áreas das ciências naturais concomitantemente com discussões humanistas que prezariam com o patrimônio tecnológico, científico e artístico desses povos, não impondo saberes que possam anular suas vivências e cultura, e tampouco passando pela apropriação cultural.

A intensão de cooperação pode ser positiva, mas é necessário que ela seja cooperação de fato, que haja uma grande flexibilidade e respeito de ambas as partes. A cooperação não deve ser imposição, principalmente em se tratando da questão educacional, em que o que se tem em jogo é a formação de um ser humano, dotado de desejos e sonhos, além de estar inserido em um local determinante, com sua cultura e tradições próprias, contudo numa realidade impar.

REFERÊNCIAS

ANTUNES, Juliana. STEAM: uma metodologia que você precisa conhecer! 16 de fevereiro 2018. Disponível em : https://tecnologia.educacional.com.br/blog-inovacao-e-tendencias/steam-metodologia-que-precisa-conhecer   Disponível em:  Acesso em 10 de maio de 2020.

BRASIL. Educação para Jovens e Adultos. Ensino Fundamental: proposta curricular – 1º Segmento [RIBEIRO, V. M. M.-coord.]. São Paulo: Ação Educativa/Brasília: MEC, 2001.

______. MEC. Secretaria de Educação Fundamental. Proposta Curricular para Educação de Jovens e Adultos: segundo segmento do ensino fundamental: 5ª à 8ª série, v 3, 2002.

______. Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs). Introdução ao Ensino Fundamental. Brasília: MEC/SEF, 1998.

______. Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs). ARTE. Ensino Fundamental: Terceiro e quarto ciclos. Brasília: MEC/SEF, 1998.

______. MEC – Ministério da Educação. BNCC – Base Nacional Comum Curricular. 2017. Disponível em: http://basenacionalcomum.mec.gov.br/wpcontent/uploads/2018/06/BNCC_EI_ EF_110518_versaofinal_site.pdf Acesso em 10 de maio de 2020.

CAMARGO, D. Metodologia STEAM: o que é e como aplicá-la? 13 de agosto de 2019. Disponível em: https://www.youbilingue.com.br/blog/metodologia-steam-o-que-e-como-aplica-la. Acesso em 10 de maio de 2020.

CPLP. (2020). Comunidade dos Países de Língua Portuguesa. Acesso em 12 de Maio de 2020, disponível em http://www.cplp.org Acesso em 10 de maio de 2020.

GAROFALO, D. Como levar o STEAM para a sala de aula. 25 de junho de 2019, Disponível em:  https://novaescola.org.br/conteudo/18021/como-levar-o-steam-para-a-sala-de-aula  Acesso em 10 de maio de 2020.

MILANI, C. R. S., CONCEIÇÃO, F. C. da, M´BUNDE, T. Saba. Cooperação Sul-Sul em educação e relações Brasil-PALOP. Caderno CRH – Cad. CRH v. 29, n. 76 Salvador jan./abr. 2016. DOSSIÊ: A COOPERAÇÃO SUL-SUL DO BRASIL COM A ÁFRICA. COORD. ENARA ECHART MUÑOZ.

CLP. Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, 2020. Disponível em: http://www.cplp.org  Acesso em 10 de maio de 2020.

RIBEIRO, D. Dicionário da Língua Portuguesa, Março 2017. Disponível em: http://www.dicio.com.br/lusofono/ Acesso em 10 de maio de 2020.

SILVA, D. B. As contradições da cooperação técnica em educação. Brasil – CPLP: caso do Timor-Leste. Publicação da Associação Brasileira de Relações Internacionais, p. 127-148, 2012.

SILVA, Diego Barbosa da. (2012). As contradições da cooperação técnica em educação Brasil-CPLP: o caso do Timor-Leste. Carta Internacional, 7(2), 149-162. Recuperado de https://cartainternacional.abri.org.br/Carta/article/view/62 Acesso em 10 de maio de 2020.

 

Notas de Rodapé:

*Arlete Rabelo de Oliveira; Discente do curso de Pós-graduação em Docência do Instituto Federal de Minas Gerais Campus Arcos. E-mail: rabelo.arlete@gmail.com.

**Jefferson Rodrigues Silva; Professor dos cursos de Pós-graduação em Docência e Engenharia Mecânica do Instituto Federal de Minas Gerais Campus Arcos. Doutorando em Educação pela Universitat de Girona (Espanha). E-mail: jefferson.silva@ifmg.edu.br.

 

Este artigo poderá ser citado como:

Oliveira, Arlete Rabelo; Silva, Jefferson Rodrigues da. O ensino de artes nos países de língua portuguesa: entre a tradição e a inovação. Revista Virtual P@rtes, p. 1-8, 2020.

 

 

 

 

 

 

 

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* Arlete Rabelo de Oliveira; Discente do curso de Pós-graduação em Docência do Instituto Federal de Minas Gerais Campus Arcos. E-mail: rabelo.arlete@gmail.com.

* Jefferson Rodrigues Silva; Professor dos cursos de Pós-graduação em Docência e Engenharia Mecânica do Instituto Federal de Minas Gerais Campus Arcos. Doutorando em Educação Matemática pela Universitat de Girona (Espanha). E-mail: jefferson.silva@ifmg.edu.br

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